Vigilância e cuidado (Chico Machado)

Terça feira da 29ª Semana do Tempo Comum. Seguimos o nosso percurso, atravessando o 295º dia, deste ano que vai caminhando para o seu ocaso. Mais exatos outros 70 dias, e abriremos a porta do ano vindouro. O tempo passa muito rápido. É preciso estarmos atentos e vigilantes, para que possamos viver na intensidade máxima de nossas possibilidades. Dar o melhor de nós mesmos, para que assim possamos ter relações fraternas de amorosidade com aqueles que estamos próximos. Vivendo e aprendendo a valorizar as nossas amizades como o fez Veronica A. Shoffstall, em um de seus textos: “verdadeiras amizades continuam a crescer, mesmo à longa distância. E o que importa não é o que você tem na vida, mas quem você tem na vida”.

A semana vai se desdobrando de forma muito triste para “nosotros” aqui da América. A população do México, principalmente. Neste domingo que passou (20) foi assassinado, na cidade de San Cristóbal de las Casas, no estado mexicano de Chiapas (sudeste), o padre indígena Marcelo Pérez Péres. Conhecido em Chiapas por seu trabalho incansável e corajoso pela paz e pelos direitos dos povos originários. Logo após celebrar a Missa, o sacerdote estava dirigindo seu veículo e foi interceptado por dois homens armados em uma motocicleta. Foi atingido por pelo menos oito tiros e morreu instantaneamente. Lendo esta informação enviada por alguns amigos, veio-me a mente, uma das frases ditas pelo Padre Júlio Renato Lancellotti: “Quando você está do lado dos indesejáveis, você é indesejável também”.

O religioso vinha recebendo ameaças, por causa de seu trabalho, na defesa dos pequenos. Mais um sangue derramado pelas causas do Reino, por um Mártir da Caminhada. Mais uma vida ceifada pela força da morte demoníaca dos poderosos. A luta continua e, jamais deveremos perder a esperança! Insistir, resistir, persistir! Esperançando sempre, com o pensamento do bispo emérito de Goiás, Dom Tomás Balduino: “Direitos Humanos não se pede de joelhos, exige-se de pé”. Esperançando também com as palavras do poeta chileno Pablo Neruda (1904-1973): “Podrán cortar todas las flores, pero no podrán detener la primavera” (“Podem matar uma, duas, três rosas, mas não conseguirão deter a chegada da primavera”).

Vigilância e cuidado. É preciso estar preparados e prontos para servir. Ser seguidor de Jesus requer que estejamos em prontidão, como nos alerta o texto do Evangelho de hoje. Jesus segue o seu roteiro rumo à Jerusalém. O seu calvário está diante de seus olhos. Mesmo assim, Ele não arreda o pé e segue ensinando seu discipulado: “Vigiai e orai para ficardes de pé, ante o Filho do Homem!” Esta é a recomendação dada para todo aquele e aquela que fizer a sua adesão ao Projeto do Reino. “Que vossos rins estejam cingidos e as lâmpadas acesas”. (Lc 12,35) Importante salientar que, no contexto bíblico, “rins cingidos” refere-se a estar preparado, estar pronto para agir, estar vigilante e atento. A expressão é uma metáfora que se originou dos costumes dos antigos, onde as pessoas usavam roupas longas e soltas. Para realizar tarefas que exigiam movimento rápido ou trabalho físico, eles precisavam amarrar suas vestes na cintura para ter liberdade de movimento.

Assim, “rins cingidos” representa estar pronto para enfrentar desafios, estar preparado para a ação e estar vigilante em relação às adversidades que, porventura, possam surgir na vida daqueles que seguem os passos de Jesus. O discípulo, a discípula, deve estar em atitude de espera contínua, a chegada imprevisível do Senhor que serve, a comunidade que permanece atenta, concretizando a busca do Reino através da prontidão para o serviço fraterno. “Já estou chegando e batendo à porta. Quem ouvir minha voz e abrir a porta, eu entro em sua casa e janto com ele, e ele comigo”. (Apoc 3,20) A verdadeira riqueza é ouvir a palavra de Jesus e ficarmos unidos a Ele.

Estar vigilante é estar preparado para o serviço, que é a vocação primeira dos que seguem a Jesus. Vigilância não se restringe a estar dentro do templo, presos às adorações e práticas intermináveis de orações, desconectadas da realidade de sofrimento dos pobres, pequenos e marginalizados. Vigilância é a atitude de quem está preparado a servir com as ações fraternas cidadãs, de serviço aos que necessitam de maiores cuidados. “Felizes os empregados que o senhor encontrar acordados quando chegar”. (Lc 12,37) Acordados para a vida! Acordados para o serviço! Acordados para sair de nós mesmos e irmos ao encontro do outro. “todas as vezes que vocês fizeram isso a um dos menores de meus irmãos, foi a mim que o fizeram”. (Mt 25,40) Vigilantes e preparados na identificação com os pobres e oprimidos, marginalizados por uma sociedade baseada na riqueza e no poder. Esta é a condição fundamental para termos o encontro pessoal com Jesus e participar da vida do Reino.