Os acasos da vida talvez não ocorram por acaso…
Meditando sobre o Retiro da Pedrinha e sobre o resumo de tudo – “Deus é Amor” – nas palavras do Padre Marques, eu me lembrei do Luciano.
Um moço que perambula pelas ruas e sobre quem já escrevi algumas crônicas. Que toca freneticamente a campainha da casa, não porque seja chato, mas porque tem uma deficiência mental leve, o que me levou a não atendê-lo no portão de casa muita vez, até que compreendi que ele é meu irmão e o toque impulsivo da campainha talvez fosse mesmo um chamado extra do Senhor Jesus, esse Deus de Amor das falas do Padre Marques.
E me vi de repente a ponderar: E se Luciano não for um simples e mortal filho de Deus, e sim o próprio Jesus? Porque por certo aqui não viria numa limousine dourada, ou mesmo numa carroça, preferindo fazê-lo com os pés rachados pelo asfalto esburacado e fervente da rua.
Mas eu falei em acasos: Não é que há alguns minutos fui mais uma vez surpreendido pelo forte tocar da campainha? Era de novo o Luciano. Pediu-me um tanto de açúcar. Voltei a indagar onde ele se recolhia para dormir e a resposta foi a de sempre: – Por aí. Sem um lugar certo. Resolvi avançar um dedo de prosa e perguntei se tinha religião.
Disse-me que acreditava em Deus, mas não entendia muito disso não… Não estiquei a conversa, que o sol ardia nas faces avermelhadas do Luciano e ele piscava muito sob o sol inclemente do quase meio-dia biriguiense.
Ademais – pensei – Luciano não devia ter tempo para minha tagarelice, que muito mantimento ainda lhe custava conseguir das almas caridosas da cidade. E ele se foi, arrastando os pés, como de praxe. E refleti: – Deve ser o próprio Jesus, sim. A ver se me penitencio de meus desacertos e incremento de alguma forma minha fé.
Padre Marques estava certo: Deus é Amor!
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