Quarta feira da décima quarta semana do tempo comum.
A semana vai se constituindo em nós, ao mesmo tempo em que vamos dando respostas aos desafios que vamos enfrentando. No dia 6 de julho é comemorado o Dia Internacional do Cooperativismo. Palavra tão desgastada nos dias atuais, sobretudo por causa da supremacia dos ideais capitalistas do “salve-se quem puder” e do “quem pode mais chora menos”. Linguagem infame e inadequada para aqueles que se intitulam “cristãos”. Definitivamente, estes não cabem dentro do projeto de Jesus. Conheço muitos católicos que nem sequer cristãos o são, por sustentarem em suas falas máximas como estas. Ser cristão é para poucos. Uma minoria sendo sinais de contradição.
O contexto de carestia está determinando o nosso modo de vida na atualidade. Nunca imaginávamos que o diesel ultrapassasse o valor da gasolina em nosso país. Consequentemente, a cada vez que vamos ao supermercado, voltamos com menos alimentos que das vezes anteriores. Isto para aqueles e aquelas que ainda têm o seu rendimento e emprego. A fome é uma realidade que faz parte do cotidiano de muitas famílias. 33 milhões não são números apenas, mas vidas que precisam viver e se alimentar. Não há algo mais degradante e triste do que ver um pai ou mãe de família ver os seus filhos chorarem com fome. É de cortar o coração daqueles que são mais sensíveis. William Shakespeare já nos dizia que: “São tão doentes aqueles que se saciam demais, como aqueles que passam fome”.
Famílias inteiras passando fome e não tendo o que comer, diante de um cenário em que o Brasil bate a cada ano, novos recordes em produção de grãos. Somente aqui no nosso estado, Mato Grosso, a produção de soja da safra 2021/22 é de 39,47 milhões de toneladas. Apesar de tamanha produção, nenhum de nós viu até o momento, algum produtor do agronegócio distribuir alimentos aos famintos pelas ruas de nosso país, como fez os assentados do MST, que já distribuíram mais de 20 milhões de toneladas de alimentos orgânicos à população mais vulnerável. Daí dá para se perceber que o Agro não é nada pop, como querem nos fazer crer. Agro é ganância, lucro e indiferença. Agro é morte!
Nas terras do “Bem Viver”, a fartura se faz presente em forma de partilha. Como faz o Povo Xavante do território A’uwé Uptabi de Marãiwatsédé. Após a colheita da safra de arroz, todo ele é ensacado e distribuído entre todos, conforme o número de pessoas em cada família. Todos os dias, por volta das 17:30 horas, só se ouve um som ritmado na aldeia, das mulheres pisando o arroz no pilão. Uma sinfonia sincrônica, mostrando que o alimento daquela tarde/noite está garantido. O mesmo fazem com a caça. Ao voltarem da caça, os homens colocam no centro da aldeia para ser partilhada com todos os demais. Há muito que aprendermos com os povos indígenas. Sua forma de organização de sociedade prioriza a coletividade. Todos são iguais entre eles e não há alguns mais iguais que outros.
Igualdade fraterna na diversidade, como fez Jesus diante de seus primeiros seguidores. O texto da liturgia que hoje estamos refletindo nos dá uma pista de como devemos ser diante do seguimento d’Ele. Chamados, preparados e enviados aos mais lascados: “Ide, antes, às ovelhas perdidas da casa de Israel!” (Mt 10,6) Numa alusão ao capitulo 34 profeta Ezequiel, em que através do Messias, o Senhor reunirá as ovelhas perdidas de Israel. Estes são os destinatários primeiros da missão messiânica de Jesus e de seus seguidores, que darão continuidade à sua ação libertadora. Não são os ricos e poderosos e nem aqueles que detém o poder. São os “Anawin”, palavra hebraica, que traduzida significa “os pobres de Javé”, “os pobres de Deus”. A palavra está no plural definindo aqueles desprovidos de bens materiais, que experimentam o sofrimento e a injustiça por causa da sua condição de pequenez, fragilidade e dependência.
O seguidor de Jesus tem o endereço certo de sua missão: ser sinal de contradição. Diante de uma sociedade que prima pela competitividade, pela meritocracia e pelo “ter sempre mais”, o discípulo de Jesus vai pela contramão. Ser parte do discipulado de Jesus, portanto, é ser um fracassado perante esta sociedade que aí está, pois não se enquadra com a forma de organização desta sociedade, baseada na injustiça, na desigualdade, na marginalização e na não partilha dos bens. Não se trata também de “levar Jesus” à estas pessoas, mas de ser a presença viva deste Jesus na vida delas através de uma ação testemunhal de libertação da anti-vida. Ser presença na gratuidade, pobreza e confiança. Ser o resto de Israel, como assim definiu o padre Júlio Lancellotti: “Eu serei sempre minoria. “E eu não quero ser nunca maioria. Nesse sistema eu me sinto um fracassado. E estou muito feliz de ser um fracassado”. Um fracassado como sinal de contradição, devolvendo a esperança aos descartados.
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