Quinta feira da Terceira Semana da Páscoa. O Ressuscitado segue ditando o ritmo de nossa liturgia e, consequentemente da vida daqueles que acreditam. Estamos caminhando a passos largos rumo ao encontro com o Espirito Santo de Deus. Pentecoste aponta no horizonte de nossa esperança. Alimentamos a nossa fé com a presença do Cristo Ressuscitado. Jesus, o enviado de Deus, revela-nos o rosto deste Deus que nos ama gratuitamente. Deus que muito ama de forma exagerada e quer dar-nos a vida. A revelar-nos esse amor, Jesus realiza a vontade do Pai, dando sua vida em favor de todos nós.
Meu coração indígena está em festa. Sincronia simbiótica com a luta dos povos originários, celebrando as suas conquistas, na teimosia e resistência de quem não se entrega, nem foge a luta. Véspera de comemorarmos mais um de seus dias, as etnias estão com as suas manifestações culturais nas aldeias, sabendo que o dia deles é todo dia. O “Bem Viver” está implícito nos seus rituais sagrados, em sincronia como os saberes ancestrais. O sangue indígena corre em suas veias, assim como nas nossas, que somos descendentes seus, mesmo que o preconceito, a indiferença e o desconhecimento de suas causas/raízes, fale mais alto dentro de nós. Eles são os únicos donos destas terras, sendo aviltados em seus direitos sagrados.
“Seduziste-me Senhor, e eu me deixei seduzir”. (Jr 20,7) Esta é uma das falas do profeta Jeremias e que faz sentido diante do contexto que a liturgia de hoje nos propõe refletir. Jeremias atuou por cerca de 50 anos, de 627 a.C. a 580 a.C. O jeito simples de ser de alguém que se deixou seduzir pela proposta de Deus e se fez um com Ele, mesmo diante de todas as dificuldades que encontrou na vida. Este versículo do profeta foi o que inspirou a liturgia de minha Ordenação Presbiteral, há 35 anos. Sentirmo-nos seduzidos pela proposta de Deus é o chamado feito a cada um e cada uma, para integrar-nos ao grupo dos seguidores e seguidoras de Jesus de Nazaré. Estar com Ele não é merecimento nosso, mas é iniciativa do próprio Pai, como Jesus mesmo inicia este texto joanino de hoje: “Ninguém pode vir a mim, se o pai que me enviou não o atrai”. (Jo 6, 44)
O Evangelho de hoje, dá prosseguimento ao “discurso eucarístico” de Jesus. Ele continua falando às multidões acerca de si mesmo, enfatizando a sua condição de ser o Pão da vida. Pão que alimenta em todos os sentidos de nossa vida e não apenas no aspecto espiritual. Alimentar deste pão é sentirmo-nos fortalecidos para continuar a nossa missão no seguimento d’Ele. Vê-lo, acreditar n’Ele, conhecê-lo, para que a nossa adesão seja consciente e transformadora, no desenvolvimento da nossa missão/fé. Amar como o Pai nos ama. Amar como Jesus amou, para que possamos ser construtores do Reino pelas rédeas do amor e da misericórdia infinda.
O texto do Evangelho de hoje é de uma profundidade teologica fenomenal. “O pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo”. (Jo 6, 51) E aqui não se trata de uma interpretação dualista entre corpo e alma, própria da filosofia platônica que, mesmo sabendo da condição imortal da alma, via o corpo como algo fraco, imperfeito, de forma negativa, funcionando como um obstaculo e até mesmo como uma prisão para a alma. Em sua mensagem teologicamente libertadora, Jesus nos emancipa deste dualismo, quando nos propõe a integração corpo e alma: “Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente”. (Jo 6,51) O corpo é criação de Deus e a alma o compõe formando uma integridade única, divina e transcendente.
A escuta é por assim dizer o elemento essencial para seguir os passos de Jesus. É por meio dela que percebemos o chamado d’Ele: “Vem e segue-me”. (Lc 18,22). A resposta a este chamado é individualizada e cabe a cada de nós, mesmo que a atividade (missão) se faça na comunidade daqueles que caminham juntos. Teologicamente, estamos diante do ensinamento do mistério do Pai e da mensagem salvífica de Deus em Jesus. Pai e Filho se apresentando à nossa humanidade. Escutar Jesus é deixarmo-nos ser conduzidos pelo próprio Pai. Com a vinda de Jesus, (vida e obras) a salvação está escancarada a todos nós, desde que nos deixemos ser atraídos e seduzidos pelo Pai: “Seduziste-me Senhor, e eu me deixei seduzir”. (Jr 20,7). Corpo e alma, uma ligação entre a fé em Jesus e a vida eterna: só viveremos a vida eterna se estivermos em comunhão com Jesus. Ele mesmo nos garantiu: “Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente”. (Jo 6,51) Jesus oferece-nos a sua própria vida (carne e sangue) em favor de todos nós. Por este motivo, o nosso compromisso com Jesus exige que também estejamos dispostos a dar a própria vida em favor dos outros irmãos nossos.
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