Sábado ou domingo? (Chico Machado)

Quarta feira da Segunda Semana do Tempo Comum. Finalmente em casa, depois de uma boa retirada de dias fora dela. Exames e consultas médicas, num primeiro momento e depois a boa nova do Curso de Verão, reencontrando a turma da Igreja da caminhada. O cansaço foi grande, mas a esperança e as energias positivas ainda maiores. Como é bom estar de volta ao meu cantinho, ao meu Araguaia! Muitos sonhos a realizar, mil ideias pra plantar. Quando a esperança se une ao sonho, as ideias surgem aos Borbotões. Agora é tocar o barco para frente literalmente.

Nesta manhã, resolvi acordar o sol na beira do Araguaia, contemplando e pisando os pés em suas águas. Nada como começar o dia rezando na companhia do místico, poeta e profeta dos pobres do Araguaia. Estar diante do túmulo de Pedro é um privilégio de poucos. Rezei e absorvi parte da energia que emerge daquele lugar santo. Minhas raízes estão fincadas neste chão que piso, sempre inspirando na vida austera de radicalidade evangélica que Pedro levou. Ele que oportunamente nos dizia: “A palavra ‘radical’ vem de ‘raiz’, e quanto mais fundo eu vou, mais forte sinto minhas raízes”.

Uma quarta feira em que a vida monástica está em festa. No dia de hoje a Igreja celebra a festa do eremita Santo Antão (251 d.C.-356 d.C.). Ele que é considerado o “Pai de todos os Monges”. Sua vida foi repleta de solidão, jejum e trabalho. Ao ficar órfão aos 20 anos de idade, distribuiu todos os seus bens aos pobres e foi morar no deserto; ali, dedicou a sua vida à ascese e à oração. Graças a esta sua vida simples, serviu de inspiração para a criação das “famílias monacais”, que, sob a sua direção espiritual, se consagraram ao serviço a Deus. No dia de sua festa litúrgica, também se costuma abençoar os animais domésticos.

“Filho, cuida da sua vida que a dos outros não te diz respeito”, afirmava Santo Antão. Um conselho prático, que nos ajuda a entender a proposta litúrgica para esta quarta feira, que nos apresenta Jesus mais uma vez na Sinagoga e, em pleno dia de sábado, realizando mais uma cura de um pobre homem com deficiência em uma das mãos. Algo inadmissível para as autoridades religiosas judaicas que observavam rigorosamente a “Lei do Sábado”. Para o judeu, as regras para o sábado eram extremamente rígidas e, sem sombra de dúvidas, a principal proibição bíblica em relação ao sábado era contra o trabalho nesse dia. Quem quebrasse a guarda do sábado era castigado com a pena de morte. Por este motivo, eles arquitetam a morte de Jesus.

“O sétimo dia, porém, é o sábado do Senhor seu Deus. Não faça nenhum trabalho, nem você, nem seu filho, nem sua filha, nem seu escravo, nem sua escrava, nem seu animal, nem o imigrante que vive em suas cidades. (Ex 20,10) É assim que está definido no Decálogo (Dez Mandamentos); e era assim que o povo judeu seguia rigorosamente, tendo no sábado o dia de descanso, não definindo casos de exceção a não ser o serviço sacerdotal no Templo. Jesus cura um homem em pleno dia de sábado. Ao fazer tal gesto (heresia), Ele não tem a intenção de polemizar com as autoridades religiosas, mas para afirmar a sacralidade do amor e da misericórdia divina que supera todo o legalismo superficial de certos pensamentos e posturas religiosas de seu tempo.

O mais importante não é a lei em si, mas o que fazemos dela em relação às pessoas, sobretudo as mais pobres. Neste sentido, Jesus mostra que a lei do sábado deve ser interpretada como libertação e vida para as pessoas. Para Ele, realizar o bem é também um trabalho sagrado. Neste contexto, o sábado torna-se a prefiguração de sua ressurreição, da confiança total da humanidade em Deus, através da pessoa de Jesus. Em outras palavras, podemos dizer que o nosso domingo é a realização do sábado. Não é distinção entre sábado ou domingo, mas a sua plenificação e aperfeiçoamento.

E agora: sábado ou domingo? Qual dos dois devemos ter como sagrado? O sentido ritual da santificação do sábado, feita pelos judeus foi reinterpretado pela tradição cristã a partir do grande evento da Ressurreição de Jesus de Nazaré que, segundo São João, se deu no primeiro dia da semana. Este primeiro dia, que depois receberia o nome latino de “dominica”, “dia do Senhor”. As lideranças religiosas não entendiam, mas para Jesus não é ilícito fazer o bem em dia de sábado, por isso Ele mesmo assumiu para si a soberania a uma lei puramente humana: “o sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado; de modo que o Filho do Homem é senhor até do sábado” (Mc 2,27-28).

Qualquer dia é dia para se fazer o bem. Sábado ou domingo, todos os dias são dias bons para se fazer o bem sem olhar a quem. Sempre é tempo para se fazer o bem. Este é o ensinamento que a liturgia de hoje quer nos mostrar. Aqueles e aquelas que vivem todos os dias semeando discórdias, ódio, rancor e todo tipo de maldade, precisam parar para pensar, nos rumos que está dando para a sua própria vida. Tudo que fazemos aos outros, volta de alguma maneira para nós mesmos; como diz o dito popular: “quem semeia vento, colhe tempestade”. E você, já parou para pensar neste bem que não está fazendo? Que a inspiração de Paulo nos ajude: “Não faço o bem que quero, e sim o mal que não quero”. (Rm 7,19)

Luiz Cassio

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