Quarta feira da Quinta Semana do Tempo Comum.
Fevereiro vai acontecendo e nos proporcionando dar conta do recado rumo às nossas realizações. O dia de ontem foi um dia especial para a nossa Igreja dos pobres. No dia 7 de fevereiro de 1909, nascia na cidade de Fortaleza, no Ceará, Dom Hélder Câmara. São 114 anos de lá até aqui. Um homem que marcou a sua época, sendo digno representante da Igreja da caminhada. Saindo de sua participação no Concílio Vaticano II (1962-1965), deu novos ares à sua vida e também para a Igreja, com a sua clara opção de viver pobre com os pobres, contra a pobreza.Fez do Palácio onde morava a sede das Pastorais Sociais e foi morar num quartinho na sacristia de uma das Igrejas do Recife. O Santo Rebelde tinha as suas causas identificadas com as causas de Jesus. Trajando uma batina surrada, trafegava livremente pelo mundo dos empobrecidos, tornando-se uma referência mundial na luta contra a pobreza. Foi um dos fundadores do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), organismo da Igreja Católica criado em 1955 pelo Papa Pio XII, atendendo a um pedido dos bispos da América Latina e do Caribe. Três anos antes, já havia fundado a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) no dia 14 de outubro de 1952, no Rio de Janeiro, dez anos antes do Concílio Vaticano II.
De espírito jovem e sempre disposto a lutar, Dom Hélder fazia a diferença da Igreja diante dos seus desafios. Como ele mesmo dizia: “O segredo de ser jovem é ter uma causa a que dedicar a vida”. Tive a oportunidade de estar com ele uma vez apenas, quando de sua palestra para os estudantes de Teologia no ano de 1985, em São Paulo. Nós que já o admirávamos pelos seus escritos, tivemos a chance de ouvi-lo com o seu testemunho de veio profético e incisivo. Naquela manhã, adotei como lema para a minha vida uma de suas falas: “quando os problemas se tornam absurdos, os desafios se tornam apaixonantes”. Foi com este espírito em mente que cheguei à Prelazia de São Félix do Araguaia.
Dom Hélder não se apegou a uma religião do medo e nem aquela da prática do puro e impuro. Sua experiência de fé estava sintonizada com a prédica e prática de Jesus de Nazaré que neste dia de hoje nos faz um alerta: “o que torna impuro o homem não é o que entra nele vindo de fora, mas o que sai do seu interior”. (Mc 7,15) Mais uma vez Jesus está às voltas com os fariseus, com a sua prática de fé baseada em preceitos, normas, diretrizes estabelecidas pela Lei. Contra esta situação, Jesus assegura que o que vem de fora não torna a pessoa mais ou menos pecadora, e sim aquilo que sai do coração dela, isto é, da consciência humana, que cria os projetos e dá uma direção às coisas.
Jesus, com o seu jeito pedagógico de ensinar apresenta para o povo mais simples e depois para os seus discípulos, uma nova forma de moralidade, onde as pessoas podem relacionar-se entre si na liberdade e na justiça. Com isso, ele aboliu a lei que se baseava na pureza e impureza tão presente no Antigo Testamento, sobretudo no Livro do Levítico (Lv 11), cuja interpretação era o fundamento de uma sociedade terrivelmente injusta, baseada em tabus que criavam e solidificavam diferenças entre as pessoas, gerando privilegiados e marginalizados, opressores e oprimidos. Daí residir o fato de que os fariseus se apegavam por demais a estes preceitos morais da Lei, pois não queriam perder as benesses e os seus privilégios de classe social que representavam.
Impureza não significa algo físico ou moral. Religião alguma salva ninguém. Cumprimento de preceitos, por mais legais que possam ser não qualifica a pessoa estar em sintonia com o discipulado de Jesus de Nazaré. O mundo não é algo que está perdido, como alguns assim o pensam. O mundo é bom, pois ele é criação de Deus. Quem torna o mundo “perdido” são as pessoas com as suas atitudes e más ações. É de dentro do coração delas que vem todas as formas de maldade e coisas ruins que temos no meio de nós. Não é o puro e o impuro que importa, mas o fundamento de uma sociedade injusta, baseada em tabus que criam e solidificam diferenças entre as pessoas, gerando privilegiados e marginalizados, opressores e oprimidos. O sonho de Deus é que as pessoas sejam livres e libertas de todas as formas de opressão, inclusive daquelas advindas dos preceitos morais impostos. Que possamos repetir sempre a antífona do Evangelho de hoje: “Vossa palavra é a verdade; santificai-nos na verdade!” (Jo 17,17)
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