Segunda feira da Quarta Semana da Quaresma. 31 de março. O terceiro mês se despedindo de nós com a estação do Outono mais com cara de verão. Estamos atravessando o 90º dia do ano de nosso calendário, dos 275 outros que restam para a nossa caminhada. Como estamos no tempo litúrgico em que somos desafiados a pensar em nossa conversão, não custa lembrar que neste ano de 2025 é também o ano do Jubileu. Celebrado a cada 25 anos, tal iniciativa visa promover uma renovação espiritual de reconciliação e de perdão. Convocado pelo Papa Francisco, o tema do Jubileu é “Peregrinos de Esperança”. Que o esperançamento preencha os nossos dias, nossas ações, nossas relações, no desejo de construirmos juntos, um mundo mais justo, mais humano e fraterno.
31 de março foi o dia em que manchamos a nossa história com o fatídico golpe civil-militar que conduziu o país para sua mais longa, cruel e brutal ditadura. 61 anos se passaram numa interrupção da Democracia, que se estenderam por longos 21 anos de ditadura civil militar brasileira (1964-1985). Os anos de chumbo. Um período muito triste de nossa história, marcada pela supressão de direitos constitucionais, pela censura e por uma sistemática perseguição, criminalização e repressão a pessoas contrárias ao regime político e social. Muitas mortes, torturas e desaparecimentos de pessoas. Precisamos ler mais, ter acesso à informação e à história política do Brasil, para que jamais nos esqueçamos e que não se repita um passado tão sombrio para várias famílias que perderam seus entes queridos. Ditadura nunca mais! Não mesmo! Sem anistia!
Ainda estamos aqui e estamos vivos! Ter consciência é um dos pilares da vida cidadã, que não podemos perder de vista. Uma semana que estamos iniciando, cheios de esperança em nossos corações para que assim possamos construir relações mais sadias, olho no olho, e não nos contentemos apenas com a dependência escrava das redes sociais, que nos distancia cada vez mais. Há pessoas que não apenas possuem um celular, mas são possuídas por ele. Como cristãos seguidores de Jesus, não podemos contentarmo-nos em fazer o mínimo, mas dar de nós o melhor que podemos ser. Que as palavras de Paulo, escrita em uma de suas cartas, nos oriente nesta perspectiva: “deem graças em todas as circunstâncias, porque esta é a vontade de Deus a respeito de vocês em Jesus Cristo”. (1 Tes 5,18) Exercitar o discernimento e espírito crítico, para que nos tornemos capazes de reconhecer e assimilar o bem, onde quer que este se encontre.
Excepcionalmente a liturgia desta segunda feira nos oferece para reflexão um texto extraído do Evangelho de João. O contexto desta narrativa de hoje, acontece com Jesus retornando à Galileia. Diferentemente dos três primeiros Evangelhos (Mateus, Marcos e Lucas), João não apresenta muitos milagres e palavras de Jesus. Em João, encontramos apenas sete milagres, que são chamados por ele de sinais, e alguns discursos que se desenvolvem lentamente, repetindo sempre os mesmos temas-chave. A perícope de hoje nos traz um destes sinais de Jesus: a cura do filho de um funcionário do rei. Um homem pagão, que demonstra, através da sua fé, acreditar na palavra que sai da boca de Jesus.
“O próprio Jesus tinha declarado, que um profeta não é honrado na sua própria terra”. (Jo 4,44) Enquanto as lideranças religiosas rejeitavam Jesus, pois não viam n’Ele nenhum sinal de que fosse, de fato, o Messias enviado, este mesmo Jesus é acolhido por pecadores, publicanos, prostitutas, doentes, samaritanos, estrangeiros e pagãos, como é o caso deste funcionário, que pede a Jesus que curasse o seu filho doente. Jesus não vai pessoalmente até o enfermo, mas “à distância”, realiza a cura. Bastou que aquele homem acreditasse nas palavras ditas por Jesus: “Podes ir, teu filho está vivo”. O homem acreditou na palavra de Jesus e foi embora”. (Jo 4,50) A partir da hora em que aquela palavra foi pronunciada, o menino ficou curado: “O pai verificou que tinha sido exatamente na mesma hora em que Jesus lhe havia dito: “Teu filho está vivo”. (Jo 4,53)
O Evangelho Joanino tem o objetivo claro de despertar e alimentar a fé em Jesus Cristo, o Filho de Deus, a fim de que as pessoas tenham a vida, como esta descrito no final de seu Evangelho: “Jesus realizou diante dos discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes sinais foram escritos para que vocês acreditem que Jesus é o Messias, o Filho de Deus. E para que, acreditando, vocês tenham a vida em seu nome”. (Jo 20,30-31). Ou seja, Jesus fala e faz acontecer. Sua missão evangelizadora se expande, distanciando-se cada vez mais do centro do poder e das instituições consideradas salvadoras. Mesmo assim, os judeus recusam Jesus, enquanto os samaritanos o acolhem. E agora um pagão acredita na palavra d’Ele e se converte com toda a sua família. Fica assim rompida a relação de dependência entre salvação e lei, entre fé e instituição religiosa. A salvação é dom gratuito de Deus para todos aqueles e aquelas que se abrem e respondem a esse dom, acreditando na palavra d’Ele. Basta simplesmente acreditar, como fez este homem de hoje.
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