Quarta feira da 27ª Semana do Tempo Comum. Estamos atravessando o 283º dia deste ano, que ainda se compõe de outros 83 mais, para darmos conta de realizar a nossa missão, como testemunhas do Ressuscitado, que vivo está no meio de nós: “Deus ressuscitou este Jesus, e todos nós somos testemunhas desse fato”. (At 2,32) Assim, o evangelista Lucas, o mesmo autor dos Atos dos Apóstolos, descreve que Jesus de Nazaré realizou entre os homens a ação de Deus voltada para a justiça e a vida, e foi morto pela estrutura injusta de uma sociedade que gera a morte. Deus, porém, condena essa estrutura, pois ressuscita Jesus e o torna Senhor do universo e da história. A morte não tem a última palavra, mas a vida.
O clima está mais ameno, e o ar mais respirável, nas terras por onde pisou, no chão descalço, o nosso bispo Pedro Casaldáliga. Suas tradicionais sandálias marcaram o chão batido desta terra. Com três dias seguidos de chuvas rápidas, já se pode sentir a diferença entre o antes e depois delas. Não é ainda a que esperamos/desejamos, mas a própria natureza, já deu o seu sinal de agradecimento, pelas águas que recebeu. Neste clima de alegria festiva, amanheci cantarolando uma das canções que muito cantávamos nas nossas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs): “Da cepa brotou a rama. Da rama brotou a flor. Da flor nasceu Maria. De Maria, o Salvador”. Lembrei-me de minha vó, que sempre nos dizia quando criança: “Quem canta, reza duas vezes”.
Por falar em reza, hoje é um dia específico de oração. No texto do Evangelho de hoje, Lucas narra um momento muito especial em que Jesus, está ensinando seus discípulos, como eles devem rezar. Certamente, eles estavam curiosos, pois em vários momentos do convívio deles com o seu Mestre, eles o viam rezando por horas a fio. Jesus que, apesar da correria da sua atividade messiânica, encontrava momentos para estar a sós com Deus, revelando assim a intimidade entre o Pai e o Filho, em formato de oração dialogal. Segundo o relato dos Evangelhos, Jesus passava madrugadas inteiras nesta sintonia com Deus Pai. Necessariamente não precisava, uma vez que havia entre ambos, uma sintonia perfeita: “Ninguém conhece o Filho senão o Pai; e ninguém conhece o Pai a não ser o Filho”. (Mt 11,27)
“Senhor, ensina-nos a rezar, como também João ensinou a seus discípulos”. (Lc 11,1) Era muito comum naquela época, os mestres ensinarem os seus discípulos algumas formas de oração. Geralmente nesta oração, vinha embutido todos os ensinamentos que eram transmitidos pelos mestres. Foi assim com João Batista e os seus seguidores, e foi assim também com o discipulado de Jesus. Desta forma, Jesus ensina a “Oração do Pai Nosso” apresentando-lhes uma síntese com o conteúdo fundamental de toda oração cristã. Sim, porque nesta oração, aprendemos a ter uma intimidade filial com Deus (Pai), apresentando a Ele os pedidos mais importantes: que o Pai seja reconhecido por todos (nome); que sua justiça e amor se manifestem (Reino); que, na vida de cada dia, Ele nos dê vida plena (pão de amanhã); que ele nos perdoe como nós devemos perdoar; que Ele não nos deixe abandonar o caminho de Jesus (tentação).
É importante frisar que este texto de Lucas, aparece também no Evangelho de Mateus 6,7-15, com uma diferença importante a ser destacada. Mateus inicia dizendo: “Quando vocês rezarem, não usem muitas palavras, como fazem os pagãos. Eles pensam que serão ouvidos por causa do seu palavreado. Não sejam como eles, pois o Pai de vocês sabe do que é que vocês precisam, ainda antes que vocês façam o pedido”. (Mt 6,7-8) Mateus faz questão de frisar que a oração do Pai Nosso, não pode ser como a oração dos fariseus e dos pagãos. É na simplicidade, humildade e intimidade com Deus, que a pessoa deve se colocar. Na primeira parte, a pessoa orante, pede que Deus manifeste o seu projeto de salvação; na segunda, pede-se o essencial para que a pessoa possa viver segundo o projeto de Deus: pão para o sustento, relacionamento fraterno com os irmãos e irmãs, sendo perseverante até o fim.
A oração se faz no recanto do interior do coração da pessoa que se coloca diante de Deus em atitude de desapego total, até de si mesma. Quem não tem atitude de oração permanente (momentos reservados para estar a sós com Deus), dificilmente entrará em sintonia com o projeto de Deus revelado por Jesus. Assim, a oração é esta peça fundamental na vida de qualquer cristão. Orar é falar com Deus! Orar é escutar o que Deus tem a nos dizer! Todo e qualquer relacionamento, pressupõe momentos de comunicação verdadeira. Infelizmente muitos ainda não entenderam a proposta oracional de Jesus e se perdem nas suas horas infindas de adorações falantes, e rezas de ave Marias mecânicas. Quem muito fala, não tem “tempo” para escutar Deus! Nosso Deus (“ábba” ou “aba” – Painho) é amorosidade, ternura e compaixão em pessoa. Em seu coração de Pai e Mãe, cabem todos nós, e as poucas palavras de nossa oração, chegam ao seu coração, pronto a nos atender, naquilo que realmente necessitamos.
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