Os sinais do Reino na história (Chico Machado)

Sexta feira da 29ª Semana do Tempo Comum. Outubro sextando pela última vez. Uma sexta feira de muito calor e nada de chuva por aqui. Estes dias tem sido insuportáveis. Nem parece que estamos em plena Estação das Flores, em que o “normal” seriam dias de chuvas intensas, aqui pelas bandas do Araguaia. Os tempos estão mesmo muito mudados, como nos alerta o ator e cineasta norte-americano Mark Alan Ruffalo: “As alterações climáticas são a maior ameaça à nossa existência nesta que é a curta história do nosso planeta, ninguém vai conseguir fugir das suas consequências.” Enquanto o homem se perde em seus descuidos, a natureza age.

É urgente e necessário o nosso cuidado para com a Casa Comum, como nos pede nosso pontífice, o Papa Francisco: “cuidar da nossa Casa Comum, mesmo sem considerar os efeitos das mudanças climáticas, não é simplesmente um esforço utilitário, mas uma obrigação moral para todos os homens e mulheres como filhos de Deus”. Cuidando desta casa, começando pelo cuidado da casa onde partilhamos com a família os momentos de maior intimidade. É preciso repensar a “cultura do descartável”, que está tão enraizada em nós, fruto de um consumismo que assumimos como filosofia de vida. Até as nossas relações humanas, passam pelo crivo desta prática do descartável. Tal atitude comportamental está estigmatizada na frase infeliz, que alguns adotam para si: “foi bom enquanto durou”.

Vivemos num mundo em que somos desafiados a interpretar os sinais do tempo, como nos pede o texto da liturgia desta sexta feira. Estamos findando o capítulo 12 do Evangelho de Lucas e, desta vez, Jesus não está se dirigindo aos seus discípulos, mas fazendo um grande alerta às multidões, quanto ao saber interpretar os sinais do Reino de Deus acontecendo na história. Um povo que sabia interpretar os sinais do tempo, os sinais da natureza, mas não estavam atentos quanto à manifestação Teofânica de Deus, através da encarnação do Verbo na pessoa de Jesus, como presença viva deste Deus na história humana.

Em Jesus, Deus vem nos visitar e estabelecer definitivamente a sua morada no meio de nós. Neste sentido, o evangelista João foi bastante objetivo: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós”. (Jo 1,14) É dentro da história humana que podemos e devemos compreender a intervenção de Deus, e não fora dela. Deus se manifestou em e por Jesus, mas também continua manifestando nos sinais dos tempos. Ou seja, Deus atua dentro do tempo. É também no tempo que Ele responde às nossas dúvidas, interpelações e interrogações. Quem de nós, nos momentos mais profundos de nossas orações, não fez as suas muitas perguntas? Todavia, as respostas a tais perguntas, nós as encontramos na vida do dia a dia. A Sabedoria de Deus acontecendo nas maravilhas do mundo e no desenrolar da história,

Ao longo da nossa caminhada nesta vida, aprendemos a prever os acontecimentos a partir dos sinais da natureza. Ela está a nos dizer que precisamos mudar as nossas atitudes, comportamentos e decisões, se quisermos viver dias melhores pela frente, ou darmos um futuro melhor para os nossos que virão. O que Jesus quer nos dizer é que, assim como podemos prever o tempo a partir dos sinais da natureza, também é possível que tenhamos a capacidade de reconhecer na atividade de d’Ele a manifestação do Reino de Deus acontecendo no aqui e agora de nossa história. Essa tarefa é por demais urgente e necessária, implicando uma decisão nossa a favor ou contra o Reino de Deus. É preciso agir enquanto é tempo, senão cairemos naquilo que François Rabelais, padre e escritor francês, lá pelos idos do Renascimento nos alertara: “Conheço muitos que não puderam, quando deviam, porque não quiseram quando podiam”.

A hora é agora! O tempo favorável é agora! Deus está a nos falar cotidianamente, através dos sinais dos tempos. Interpretar estes sinais é nos colocarmos na construção de relações de amorosidade, ternura e compaixão com os nossos irmãos e irmãs, experimentando desde já as benesses do Reino. Ser pelo Reino é ser sinal de contradição, sem deixar passar esta hora oportuna, como orientou Paulo a Comunidade de Corinto: “Como cooperadores de Deus, insistimos com vocês para não receberem em vão a graça de Deus. Pois Ele diz: Eu o ouvi no tempo favorável e o socorri no dia da salvação”. (2Cor 6,1-2) Não basta ler a Palavra, mas é preciso confrontá-la com os sinais dos tempos, permitindo que esta mesma, produza os frutos em nós e no nosso tempo. Ler, escutar, conhecer esta Palavra, colocando-a em prática, contribuindo assim com a obra de Deus no mundo.