Impressiona a narrativa bíblica acerca do nascimento de Moisés (Êxodo 2), que aconteceu num contexto opressor do Império Egípcio. A resistência sábia de uma mãe, com sua esperteza frente à lei da morte de todos os filhos homens nos mostra o medo do Faraó, que temia uma revolta dos oprimidos. Com certeza viraria a mesa e mudaria o sistema com a revolução dos escravizados, caso aquelas crianças crescessem. Melhor seria matá-los ao nascer, se fossem homens. Fato político fácil de entender pela clareza que a Bíblia traz.
Certa vez, ouvi uma crítica à mídia corporativa atual, se fizesse a reportagem do fato. Dizem que a midia dos dias de hoje, sobretudo para as questões de economia, é controlada pelos bancos que compõem um império financeiro e especulativo.
Anunciariam o gesto da mãe de Moisés não considerando o sofrimento dos oprimidos, mas a paralisação das obras do Faraó e a descontinuidade da escravização: “Mãe perversa tenta afogar o filho no Rio Nilo”. Manchete certamente desviante do interesse dos pobres ao salvamento da criança (Moisés) que a filha do Faraó operou, quando encontrou a cestinha de junco descendo o rio. A gente sabe que a mãe da criança fez isso como gesto estratégico de sábia mulher do povo para livrar o filho da morte e prosseguir o chamado de Deus para ser libertador politico, tal como prossegue o livro do Êxodo com as pragas e a fuga do Egito.
Este fato bíblico leva-me a situar, nos dias de hoje, a identidade de dois meninos com o nome de Moisés, um tendo sido salvo do fogo, em brasas ardentes, depois do despejo criminoso da fornalha de uma fábrica de cimento, funcionando numa região de famílias pobres que moravam na vizinhança. (Essa história já publiquei, quem quiser conferir acesse o link que postarei abaixo).
Mas no presente texto quero centrar minha atenção para outro “Moisés”, que um amigo meu, chamado Luiz Silvério, me inspirou para escrever aqui. Fato que acontecera no alto da Serra da Mantiqueira, próximo ao munícipio de Itatiaia (RJ), onde se fez um verdadeiro milagre, em 1966, ocasião em que uma grande catástrofe destruiu um bairro todo, quando as águas romperam uma contenção natural de árvores no Rio Preto, uma miniatura de catástrofe diante do rompimento das barragens de Mariana e de Brumadinho, MG, operadas pelo império das mineradoras, destruidoras da natureza.
Nesse caso do bairro de Maromba, ((RJ), deu-se uma forte chuva, que atingiu uma grande região do estado do Rio de Janeiro, em 1966. Os jornais noticiaram com a seguinte manchete: “Enchentes no Estado do Rio de Janeiro provocaram inundações e diversas regiões com milhares de desabrigados”. Sabe-se que, no bairro de Maromba, 19 pessoas morreram e foram enterradas numa área fora do cemitério, porque não havia lugar no cemitério da cidade para tanta gente.
Meu amigo Silvério, que visitou o bairro de Maromba, relatou que atualmente é “um lugar encantador pela existência de belíssimas cachoeiras e agradabilíssimo pela acolhida carinhosa de todos seus habitantes, que jamais esqueceram da catástrofe ocorrida, nem do inusitado milagre”. O visitante fez questão de conhecer e conversar com uma pessoa de 58 anos, o Sr. Moisés, salvo nas águas barrentas da daquela grande inundação, quando tinha 5 dias de vida.
Recebeu o nome de Moisés pois foi salvo das águas pelo Sr. Dedé, que, por volta das 22h, nos trabalhos de recolhimento das vítimas, escutou um choro de bebê afundado no meio da lama na Praça da Igreja. “Diante de tromba d’água devastadora (água, árvores, pedras), ninguém sabe explicar como Moisés, cuja família morava próxima às margens do Rio Preto, foi salvo, já bastante debilitado e sem roupas. Todos dizem ter sido um MILAGRE que aconteceu naquele bairro”, afirmou o Silvério, depois de muita conversa com o povo, mas sobretudo por ter conhecido o Moisés, marcado para viver e ajudar seu povo a ser grato a Deus e a enfrentar as adversidades da vida.
Hoje, o Moisés, salvo das águas, é proprietário de uma pousada e de um restaurante, bem na Praça da Igreja, onde conta a sua história para todos e vive lamentando as represas que põem em risco a população das áreas de mineração.
Quanto ao Moisés que foi salvo do fogo, por enquanto, está desaparecido do meu contato. O que lamento muito, mesmo depois de muita busca. Apenas um fato perdido no tempo que despertou a consciência das famílias para o cuidado dos filhos e o quanto de lucro se concentrava na mão dos donos das fábricas de cimento do Distrito Federal.
Obs. As 3 fotos são de autoria de Gisele B. Alfaia.
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