Trigésimo quarto domingo do Tempo Comum.
Último domingo do tempo comum. No próximo, já iniciaremos um novo tempo litúrgico, com a chegada do Advento. A nossa Igreja estabeleceu, para o Rito Romano, uma sequência de leituras bíblicas que se repetem a cada três anos, nos domingos e nas solenidades. As leituras desses dias são divididas em ano A, B e C. No ano A, refletimos os textos do Evangelho de Mateus, no ano B, o de Marcos e no ano C, o de Lucas. Já quarto Evangelho Joanino, é reservado para as ocasiões especiais, principalmente as grandes Festas e Solenidades. Tudo isso no intuito de fazer os cristãos católicos, de três em três anos, ao acompanharem a liturgia diária, terem a oportunidade de ler boa parte da Bíblia.
Manhã de frio atípico aqui pelas bandas do Araguaia. O sol sequer deu as caras, escondendo-se por detrás das densas nuvens. A chuvinha que mansamente caia prenunciava um domingo diferente. Timidamente, meu quintal amanheceu num clima monástico, com o silêncio reinando absoluto. Apenas o barulho dos pingos sobre a folhagem. Eu que planejara rezar na companhia de Pedro, demovi-me da ideia, tão logo vi a cara do dia. Enquanto rezava, aproveitei para degustar uma boa cuia de chimarrão, com a água aquecendo as minhas entranhas. Nenhum dos pássaros amigos quis desafiar a chuva, aproveitando de uma boa soneca matinal. Este contexto me fez Lembrar da letra de uma das canções de Renato Russo: “Eu rabisco o sol que a chuva apagou”.
Hoje é o dia de uma festa muito especial na Igreja: Solenidade de Cristo Rei. Na realidade, a data original da festa de Cristo Rei era o último domingo de outubro, ou seja, no domingo que precedia a festa de Todos os Santos, mas, com a nova Reforma de 1969, esta Solenidade foi transferida para o último domingo do Ano Litúrgico. Jesus o Rei do Universo. O Rei dos reis. Um reinado diferente dos muitos reinados da humanidade, pois, fica claro que Jesus Cristo, o Rei, é a meta de toda a nossa peregrinação terrestre. Conhecê-lo é entrar na intimidade intrínseca do seu ser Rei. Por este motivo, os textos trazidos pela liturgia mudam periodicamente em todos os três anos, para que possamos conhecer, plenamente, a figura de Jesus.
“Jesus Nazareno, o Rei dos Judeus”. Estas foram as palavras que foram escritas em uma placa e colocada na cruz de Jesus, acima de sua cabeça. INRI, uma expressão originária do latim: “Iesus Nazarenus Rex Iudeorum”. Evidente que tal letreiro não expressa o real reconhecimento daqueles que o crucificaram, mas a zombaria e o escárnio do poder romano diante daquele que se autodenominava “enviado de Deus”. Jesus um malfeitor, crucificado entre os malfeitores. Condenado por blasfemar contra a lei de Deus, que todo judeu deveria cumprir a risca. Acusaram-no também por se rebelar contra o Império Romano. Todos os crucificados traziam sobre a sua cruz o motivo de sua execução em uma placa, para que todos soubessem que esse crime tinha um castigo severo. A placa na cruz de Jesus indicava o “crime” pelo qual foi morto.
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Jesus é crucificado como criminoso, entre criminosos. O prisioneiro político perseguido, preso, torturado e morto entre dois poderes: o poder do Estado e o poder religioso. Não nos esqueçamos que quem arquitetou a morte de Jesus foram aqueles que se intitulavam os religiosos da época. Eles não tinham autorização para executar Jesus, por este motivo, se aliaram ao poder romano. A cruz da maldição de Jesus é a resposta ao seu amor infinito, pelo qual deu a sua vida. Morreu por amor! Entre a curiosidade do povo e a zombaria dos chefes e soldados ecoa a palavra de perdão: os responsáveis pela morte de Jesus devem ser perdoados, porque não conhecem a gravidade e as consequências do próprio gesto. Zombaria inclusive de um pobre coitado como muitos pobres que não se vêem como tal, nos fazendo lembrar uma realidade muito comum entre nós: “o maior e pior inimigo do pobre é o pobre que pensa que é rico!” Pobre instrumentalizado pelo rico.
No momento em que tudo parece perdido, Jesus se mostra que Ele é aquele que nos traz a salvação. Ele é o Rei dos pobres! Foi para isso que veio estar entre nós. Contemplar o Crucificado é contemplar todos os crucificados da história. Não basta beijar a cruz de Jesus numa devoção alienada, se não nos identificarmos com todos aqueles e aquelas que se encontram crucificados: fome, desemprego, sem teto, injustiçados, doentes, marginalizados, excluídos. Estes são os destinatários primeiros do reinado de Jesus. Não de um Reino distante, no pós-morte, mas no Reino do aqui agora da vida que precisa ser vivida na sua integralidade. Jesus não está sozinho na cruz. Acompanham-no todos aqueles e aquelas que são condenados por uma sociedade que não aceita o projeto de Deus e que clamam: “Lembra-te de nós!” (Lc 23, 42) Uma festa que nos indica o caminho a seguir.
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