Segundo domingo do Advento.
No passo a passo da vida, vamos caminhando para o Natal. Tempo extraordinário de fé e esperança. Para os cristãos, momento de celebrar o ponto de partida onde tudo começou.
Na singeleza de uma criança humilde e pobre, vem a perspectiva de uma esperança renovada. A possibilidade de renovação do nosso espaço interior existencial, para chegarmos ao chão social de nossas vidas. Não é à toa que neste domingo, as nossas comunidades acendem a vela verde da “Coroa do Advento”, simbolizando a esperança fundamentada na fé dos Patriarcas bíblicos (Abraão, Isaque e Jacó).
Neste domingo aparece para nós toda a simbologia presente no deserto. Lugar privilegiado de purificação e de discernimento de quais caminhos escolhermos para dar prosseguimento no nosso itinerário de fé. Neste deserto aparece também a figura de João Batista, o “maluco de Deus”. Ele que se denomina como o precursor, ou seja, aquele que vem à frente do Mestre, preparando o caminho para a Boa Nova que estava prestes a acontecer. Humildade a toda prova, pois não se colocou no lugar do Messias: “É preciso que ele cresça e eu diminua.” (Jo 3,30) Sabia de antemão qual era o lugar de sua missão, diante do Projeto de Deus.
O deserto sempre fez parte da vida e da história do povo de Deus. No contexto bíblico, ele aparece como um espaço geográfico privilegiado para as provações, as reflexões, dúvidas, e ainda como o lugar de espera e confirmação por parte de Deus, sobre que rumos e direção tomar. O povo israelita, por exemplo, passou pela experiência do deserto, assim que se libertou do cativeiro do Egito. Segundo alguns exegetas, esta foi uma das estratégias escolhidas por Moisés, pois sabia ele que era necessário que toda uma geração morresse, para que pudessem adentrar a Terra Prometida e não cometer ali, os mesmos vícios do período escravagista. Moisés, inclusive, sacrificou o seu sonho de chegar ao destino traçado por Deus, pois morreu durante a travessia.
João Batista é um personagem central no Projeto salvífico de Deus para a humanidade. Com a sua presença, fecham-se as portas do Antigo Testamento e abre a nova perspectiva da era messiânica de Jesus. Não que o Antigo Testamento não tenha mais significância, mas a partir deste momento, quem dá as coordenadas é Jesus, revelando-nos o rosto maternal de Deus. Um Deus ternura e compaixão que, através de sua amorosidade, olha para a humanidade com um novo olhar, fazendo-se presente no meio dos pequenos, pobres e marginalizados. Aquele Deus carrancudo e vingativo de nossa fé infantil, deu lugar ao Deus amorosidade em pessoa. Esta foi a grande novidade trazida por Jesus e que podemos definir numa frase: “Deus é amor”. (1Jo 4,8) O amor é a essência do ser de Deus. Tudo o que Ele faz, vem de seu amor: por nós pela justiça, pelo bem, pela verdade.
O Centro da nossa vida humana é a prática inconteste do amor. Só há sentido em existir verdadeiramente se estivermos imbuídos e grávidos deste amor. O contrário disso é o desamor e seus derivados. O ódio é um grande desvio dos atalhos que vamos escolhendo em nossa caminhada terrestre. O simples ato de sermos gerados no ventre materno advém de uma relação de amorosidade dos nossos pais, prefigurando assim a grande ternura que Deus tem para conosco, “pois Deus amou de tal forma o mundo, que entregou o seu Filho único…” (Jo 3,16) Jesus é conhecido pela entrega de si mesmo, no amor, até o fim, com todas as suas conseqüências. (Jo 13,1).
Um dos aspectos a serem observados no texto da liturgia de hoje é a datação histórica feita pelo evangelista Lucas, situando Jesus num contexto histórico: “No décimo quinto ano do império de Tibério César, quando Pôncio Pilatos era governador da Judeia, Herodes administrava a Galileia, seu irmão Filipe, as regiões da Itureia e Traconítide, e Lisânias a Abilene; quando Anás e Caifás eram sumos sacerdotes…” (Lc 3, 1-2). Não somente para evidenciar a encarnação histórica do Verbo, mas para mostrar também as autoridades politicas e religiosas de sua época, que estavam frontalmente contrárias ao Projeto de Deus e a autoridade de Jesus.
É neste contexto que João Batista nos convida a adentrar no nosso deserto existencial e buscar a partir daí a nossa conversão (metanoia). Ele nos convida à uma mudança radical de vida, porque a nova história a ser construída vai transformar pela raiz as relações entre as pessoas. Mudança de mentalidade e de atitude frente à vida, não através de uma fé intimista, teórica e superficial, mas através de decisões e atitudes concretas, assumidas pelo nosso sim no seguimento de Jesus de Nazaré. Acreditando sempre de que somos capazes de fazer acontecer esta nova história, longe de ficarmos fechados em nossos próprios interesses e egoísmos, que geram opressão e exploração.
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