Quarta feira da 26ª Semana do Tempo Comum. Outubro vai dando o ar da graça na estação primaveril. As flores e o verde vão aos poucos tomando conta dos espaços, com os ipês predominando com as suas cores sempre vivas. A despeito da nossa crueldade em destruir a natureza, Deus continua apostando, de que um dia seremos outros, e saibamos lidar melhor com a obra da criação. O ser criado por Deus clama por vida, para que sejamos mais vida em plenitude. Diante deste cenário, como não lembrar-nos daquilo que disse o filósofo iluminista alemão Immanuel Kant (1724-1804): “Entre todas as coisas magníficas da criação de Deus, duas deixam para trás as outras; uma está acima de nós – a imensidão dos céus estrelados; a outra dentro de nós – o espírito do ser humano”.
Dia 2 de outubro. Na data de hoje, celebramos a memória dos Santos Anjos da Guarda. Antes de tudo, é bom que saibamos que os Anjos, fazem parte de um dogma de fé, que está presente na história da Igreja desde o Concílio de Nicéia, que aconteceu entre os meses de maio a agosto do ano de 325 d.C. Todavia, os Santos Anjos, passaram a fazer parte da liturgia em 1670, quando foi instituído como memorial litúrgico pelo Papa Clemente X, cujo pontificado ocorreu entre os anos de 1670 a 1676. A devoção aos anjos vem primeiro que a devoção aos santos, sobretudo na Idade Média (séculos V e XV), graças à contribuição dos monges eremitas que, segundo eles, viviam em companhia dos Anjos da Guarda.
A existência dos seres espirituais, não-corporais, que a Sagrada Escritura chama de anjos, é uma verdade de fé. O termo “anjo” diz respeito a uma criatura celestial bem próxima de Deus. Não é sem razão que seu nome é citado pelo menos 175 vezes no Novo Testamento e uma centena de vezes no Antigo Testamento. Segundo a tradição bíblica, os anjos são os mensageiros das ordens divinas, manifestando-se em momentos pontuais da história da salvação. A função específica dos anjos é acompanhar as pessoas no caminho do bem, promovendo assim a harmonia do encontro delas com o Deus Criador de tudo e de todos. Entretanto, entre os anjos e o amor, fiquemos com o segundo, como Paulo mesmo nos orienta: “Ainda que eu falasse a língua dos homens, e falasse a língua dos anjos, sem amor, eu nada seria”. (1Cor 13,1)
O amor é a fonte principal e a essência de toda a existência humana. Tudo porque o nosso Criador é Amor: “Deus é amor!”. (1Jo 4,8) Jesus, o Verbo Encarnado, é o enviado do amor (cf Jo 3,16). O centro do Evangelho é o mandamento do amor (cf. Mc 12,28-34). Como vemos, o amor é a fonte de todo e qualquer comportamento verdadeiramente humano, pois leva a pessoa a discernir a realidade e a criar gestos, capazes de responder adequadamente aos nossos anseios e problemas. O amor é a força de Deus e também a força motriz da pessoa aliada a Deus. É a fortaleza que sustenta o testemunho do ser criado, pois: “Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”. (1Cor 13,7) A infinitude do amor transcende o tempo e o espaço, porque ele é a vida do próprio Deus.
O amor está no ar! O amor está nas palavras de Jesus, que Mateus faz chegar até nós, não apenas em enunciados, mas com gestos concretos. Mais uma vez, os discípulos do Mestre dos mestres, tentando seduzi-lo, desejos de alcançarem os melhores postos junto d’Ele. Se antes, Jesus os alerta que o maior é aquele que serve a todos, agora este maior está simbolizado pela simplicidade de uma criança. A criança é o paradigma e modelo para o discipulado, que é desafiado a buscar não uma sociedade que se baseia na riqueza e no poder, mas na vivência da partilha fraternal. Na sociedade proposta por Jesus, o maior ou o mais importante é aquele/a que se converte, deixando todas as pretensões sociais, para pertencer a um grupo que acolhe fraternalmente Jesus na pessoa dos pequeninos, fracos e pobres.
A sintonia que devemos ter com Jesus é a mesma de uma criança, simples, humilde e sincera, desprovida das grandes pretensões dos adultos. “Não desprezeis nenhum desses pequeninos, pois eu vos digo que os seus anjos nos céus veem sem cessar a face do meu Pai que está nos céus”. (Mt 8,10) Jesus mostrando a sua pedagogia libertadora, sob a ótica dos pequenos, como uma criança. Como Deus nos protege com os seus anjos, assim também devemos proteger e cuidar dos irmãos e irmãs, sobretudo os mais frágeis e pequenos, confiados na ação dos anjos sobre nós: Nenhum mal há de chegar perto de ti, nem a desgraça baterá à tua porta; pois o Senhor deu uma ordem a seus anjos para em todos os caminhos te guardarem”. (Sl 90(91), 10-11) Com a proteção dos anjos, despertemos a criança que dormita dentro de nós.
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