Terça feira da 27ª Semana do Tempo Comum. O mês de outubro alegrando a estação primaveril, trazendo-nos as primeiras chuvas. Na tarde/noite de domingo, uma. Ontem, a tarde, São Pedro fez cair a segunda. Depois de sete meses sem, elas voltaram, dissipando a fumaça, molhando a terra e amenizando um pouco o forte calor. Contemplei a alegria festiva dos pássaros, cantarolando e deixando molhar suas vestes naturais. Eles, mais do que nós, estavam sentido a falta das chuvas. Seja bem vinda, irmã chuva! Traz para nós o florescer da esperança de dias melhores, irrigando nossos sonhos!
Rezei nesta manhã, acompanhado pelo cheiro de terra molhada do campo santo, onde repousam os restos mortais do profeta do Araguaia. Entre o cantar dos pássaros, anunciando o dia, a brisa leve da manhã e as flores, salmodiei o dia, abraçando a solidão daquele momento, ao som das águas correntes do Araguaia, relembrando das palavras poéticas de Pedro “Somos a solidão que suportamos, que acolhemos, que partilhamos, que transcendemos”. Palavras se fazendo vidas no esperançar de quem acredita nelas, sonhando o sonho possível de novos amanheceres vindouros, plenos de luz.
Feliz de quem ouve e observa a palavra de Deus! Ouvir com os ouvidos e sentir com o coração. Sintonia de sentidos apurados, visando uma prática para os dias atuais. Liberdade de pensar, para um agir consciente e transformador. Deus se fazendo vida em nossas vidas. Palavra e ação conjugadas na mesma interlocução. O falar de Deus, adentrando os espaços do coração, para dai se transformar em ação. Ação de libertação. O agir de Deus, guiado pela força do Espírito, onde a vida humana, ganha novos contornos, experimentando de perto o Ser Transcendente e Divinal de Deus. É no colo amoroso de Deus que os nossos sonhos ganham vida em plenitude.
Findei a minha manhã dialogal com Pedro, pedindo a sua intercessão por todos nós, sem me esquecer do “trio parada dura”, que o Evangelho de Lucas hoje nos relata: Jesus, Maria e Marta. A caminho de Jerusalém, rumo à consumação de seu mistério pascal, Jesus entra em Betânia, indo direto para a casa de Lázaro, Marta e Maria. No texto de hoje, no entanto, o evangelista omite a participação de Lázaro na cena. Maria é quem faz as honras da casa e recebe Jesus, coisa que não era comum na época, já que esta função era específica dos homens. Até neste sentido, o texto de hoje rompe com os paradigmas. Até porque, para Jesus, não importa se é homem ou mulher, como Paulo posteriormente decifrou em uma de suas cartas: “Não há mais diferença entre judeu e grego, entre escravo e homem livre, entre homem e mulher, pois todos vocês são um só em Jesus Cristo”. (Gal 3,28)
Jesus é acolhido por Maria numa atitude de escuta do Mestre. Marta, por sua vez, está atenta aos afazeres e com os cuidados da casa. Escutar Jesus e fazer as coisas para que o ambiente seja acolhedor. Escuta da palavra e diaconia. Ambas as dimensões podem coexistir na mesma pessoa e serem complementares. Ambas são importantes para quem deseja fazer a sintonia com o projeto de Jesus. O aspecto mais relevante, em Maria, é o de estar numa atitude de escuta disponível para acolher o outro e a sua palavra, especialmente quando o outro é o próprio Deus na pessoa de seu Filho. É constitutivo do ser humano a arte do encontro. A melhor parte de Maria é de ter escolhido o serviço e a diaconia da escuta, não só dos ouvidos, mas do coração, desenvolvendo a pedagogia do cuidado da pessoa que é acolhida.
Os movimentos mais conservadores dentro da nossa Igreja usaram este texto de hoje para justificar a vida contemplativa (Maria) em detrimento da vida ativa (Marta). Os dois momentos são importantes para o bom desenvolvimento da vida cristã: escutar o que Jesus fala, para depois partir para o campo da ação. O que Jesus nos propõe como metodologia, é que saibamos escutar a palavra antes do agir. Mais importante do que fazer as coisas, é fazê-las de modo novo. Para isso, é preciso ouvir a palavra de Jesus, que mostra o que fazer e como fazer. Marta acolhe Jesus com os cuidados; Maria senta-se a seus pés e escuta a palavra. Duas discípulas atentas a seu Mestre. Jesus que acolhe as mulheres em seu grupo, e sabe que delas partirão as melhores ações, dada à sensibilidade do coração feminino. A melhor parte não será tirada de quem ama, escuta e está sempre pronto a servir, que as mulheres sabem muito bem como fazer. Falar é uma necessidade; a escuta é a arte de quem sabe se abrir ao novo para agir.
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