Quinta feira da Oitava da Páscoa do Cristo Ressuscitado. Jesus está vivo e segue o seu caminho de se apresentar aos seus seguidores e seguidoras. Para tristeza do Império da morte, aquele que eles tentaram dar um fim, continua mais vivo do que nunca. A história deu uma reviravolta. O plano de Deus de visitar o seu povo e fazer morada no meio dele, concretiza-se em Jesus de Nazaré que agora ressurge como o Cristo da fé. Jesus como Verbo Encarnado é a união perfeita da humanidade com a divindade presente em Deus, para nossa alegria e salvação. Já não é mais a promessa da Antiga Aliança, mas Deus está no meio de nós na pessoa do Cristo Ressuscitado.

Liturgicamente, cada dia desta semana é como se fosse o dia da Páscoa de Jesus. Cada dia das nossas vidas é mais um dia pascal, em que temos a oportunidade de nos unirmos a Ele, e experimentar a mesma divindade de Deus. Em Jesus, o ser transcendente de Deus se faz morada definitiva e, nós com Ele, somos estas novas criaturas, seladas pela amorosidade e misericórdia de Deus, que quer-nos felizes e vivendo na plenitude de todas as nossas possibilidades. É preciso ter uma fé amadurecida para podermos fazer a mesma experiência de São Paulo, quando diz com estas palavras fortes: “Eu vivo, mas já não sou eu que vivo, pois é Cristo que vive em mim. E esta vida que agora vivo, eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim”. (Gl 2,20) Acreditar em Jesus Cristo é colocá-lo no centro da nossa vida, a ponto de poder dizer: “Já não sou eu que vivo, pois é Cristo que vive em mim”.

Com o coração ainda entristecido, seguimos nos despedindo do pontífice de Roma. Se bem que para muitos de nós, morreu Jorge Mario Bergoglio, mas Papa Francisco continua muito vivo, nos exemplos e ensinamentos que nos deixou, para serem perpetuados para além da Cúria Vaticana. O Papa da simplicidade/humildade, do diálogo, da abertura ao social e da preocupação com a Casa Comum e os mais esquecidos. Quebrou muitos protocolos e abriu-se à modernidade, permitindo que mulheres e leigos, tivessem acesso aos meandros hierárquicos da Cúria Romana. Papa Francisco ouviu muito bem o conselho dado pelo cardeal que me ordenou diácono, Dom Cláudio Hummes: “Não se esqueça dos pobres!” Dificilmente teremos outro que consiga ser como ele, mas o seu legado precisa estar presente neste novo papa que virá. Como o outro Francisco de Assis, este também será lembrado por muitas gerações, pelo seu jeito simples de ser e viver. “Comece fazendo o que é necessário, depois o que é possível, e de repente você estará fazendo o impossível”. (São Francisco de Assis)

Como dizia Papa Francisco, “nossa vida é um caminho, quando paramos, não vamos para frente”. É assim que também devemos nos sentir diante do Cristo Ressuscitado, que segue o seu caminho no meio de nós, como o texto litúrgico de Lucas hoje nos inspira na reflexão. Jesus seguindo o seu caminho, rompendo as paredes da incompreensão e aparecendo aos discípulos e discípulas, revelando-se quem Ele é, a partir dali: o próprio Jesus apareceu no meio deles e lhes disse: “A paz esteja convosco!” (Lc 24,36) Além de revelar-se como o Cristo Ressuscitado, Ele quer transmitir a sua paz, pois o momento ali presente era de muitas incertezas e inseguranças. Nada melhor do que a paz verdadeira para tranquilizar os espíritos dissolutos e devolver a vontade de lutar.

Depois de aparecer aos discípulos de Emaús, Ele agora se faz presente junto de todos. A Ressurreição não é uma mera fantasia. Ela está alicerçada e teologicamente sedimentada na literatura velho testamentária, conforme o relato de Lucas: “era preciso que se cumprisse tudo o que está escrito sobre mim na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos”. (Lc 24,44) Jesus não é um sonhador querendo se passar por Deus, conforme a interpretação das autoridades religiosas de seu tempo. Ele é o Filho de Deus anunciado desde sempre pelos profetas, dando testemunho de que a promessa de Deus se realizaria com a chegada do Messias: Deus visitando o seu povo e fazendo morada definitiva no meio dele. A Páscoa de Jesus é o sentido mais profundo da história do povo de Israel, se tornando o fundamento da fé da Igreja e da sua obra e ação missionária: “no seu nome, serão anunciados a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém”. (Lc 24,47)

De discípulos seguidores de Jesus de Nazaré, eles agora se transformam em apóstolos missionários da fé com o Cristo Ressuscitado, mediante a ação do Espírito Santo, recebido em Pentecostes. É importante que se saiba que a Ressurreição de Jesus não é um mero fenômeno puramente espiritual. A Ressurreição é um fato teológico transcendente que atinge o próprio corpo; daí a identidade do Ressuscitado com o Jesus terrestre histórico. Dali em diante qualquer ação humana realizada que traz mais vida para os corpos oprimidos, rejeitados, doentes, torturados, famintos e sedentos, não é apenas obra de misericórdia, mas é um sinal concreto do fato central da fé cristã: a Ressurreição do próprio Senhor Jesus dos marginalizados. Como diria Santo Agostinho: “Aos cristãos não é poupado o sofrimento, aliás, a eles cabe um pouco mais, porque viver a fé expressa a coragem de enfrentar a vida e a história mais em profundidade. Só experimentando o sofrimento, conhecemos a vida na sua profundidade, na sua beleza, na grande esperança suscitada por Cristo crucificado e ressuscitado”.