Sábado da 24ª Semana do Tempo Comum. Véspera da primavera, aqui no Hemisfério Sul. Como sempre, no dia hoje, comemoramos o Dia da Árvore. Exatamente esta nossa irmã, tão judiada e perseguida pelos arautos do capitalismo, que veem a terra apenas como um bem de capital. Ao contrário dos povos indígenas que querem a floresta em pé, o latifúndio do agronegócio e dos pecuaristas querem “terra arrasada”, para salvar a sua ganância, em busca dos lucros fartos. No dia da árvore, nos voltamos para a nota publicada ontem pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), sobre os eventos climáticos extremos. No documento, “a CNBB aponta que a gravidade deste momento exige de todos coragem, sensatez e pronta correção de rumos”. A Casa Comum pede socorro.

No Dia da Árvore, São Félix do Araguaia amanheceu pleno de fumaça. Impossível de avistar a Ilha do Bananal do outro lado do rio. Ela simplesmente desapareceu de nosso campo visual. Rezei a oração do desolamento, em meio a esta catástrofe, vendo o sol resistindo em querer nos aparecer, como sempre faz, trazendo o dia pela mão. Como manter a esperança, depois de dias tão conturbados, onde estamos a mercê das forças do mal? Na luta contra a desesperança, do fundo do meu coração resgatei um dos versículos do profeta Isaías : “Põe-te em pé! Levanta-te e resplandece, pois a tua Luz é chegada, e a Glória do Senhor raia sobre ti”. (Is 60,1) Mesmo se referindo à Jerusalém, bem que podemos adotar esta postura em dias tão tenebrosos, confiantes na manifestação gloriosa do Senhor.

Os tempos são difíceis, mas a misericórdia precisa andar de mãos dadas com a justiça. Como aprendi que a esperança é uma das virtudes teologais, nada como manter vivo o nosso esperançar, e rezar com a confiança do salmista, através de um dos seus versículos que assim diz: “Amor e Fidelidade se encontram, Justiça e Paz se abraçam. A Fidelidade brotará da terra, e a Justiça se inclinará do céu. O Senhor nos dará a chuva, e nossa terra dará o seu fruto”. (Sl 85 (84), 11-13) Deus anuncia a paz, a plenitude de condições de vida, se nos convertermos ao projeto d’Ele. A glória ou presença de Deus volta à terra, acompanhada pelo amor, fidelidade, justiça e paz, que produzem prosperidade para todos nós.

Deus, através de Jesus, o Cristo, nos chama para construirmos o seu Reino no aqui e agora de nossa história. É desta forma que podemos interpretar o texto que a liturgia deste sábado nos proporciona refletir: o chamado de um coletor de impostos. Mateus, falando de si mesmo e do chamado que Jesus lhe fizera. Aliás, o texto de hoje, aparece nos três Evangelhos Sinóticos: Mateus 9,9-13, Marcos 2,13-17 e Lucas 5,27-28. Enquanto os outros dois, chama o cobrador de impostos pelo nome de Levi, Mateus refere-se a si com seu primeiro nome. Um publicano, que era um grupo de pessoas pouco honestas e desprezadas, porque colaboravam com os dominadores romanos, aproveitando-se também para embolsar uma parte dos impostos. Por estes motivos, eram mal vistos e desprezados pelo povo da Palestina.

Jesus não chama pessoas “qualificadas” pelos seus conceitos morais e éticos (bons e maus), mas chamam os desprezíveis, pessoas marginalizadas pela sociedade judaica da época. Ou seja, Jesus rompe com os esquemas sociais que dividiam as pessoas em boas e más, puros e impuros. Chamando um cobrador de impostos para fazer parte do grupo de seu discipulado, e comendo com os pecadores, Ele mostra que a sua missão é reunir e salvar aqueles que a sociedade farisaica hipócrita rejeita como maus: “Aqueles que têm saúde não precisam de médico, mas sim os doentes”. (Mt 9, 12). Ainda bem que temos um Papa que tem a coragem de dizer isto: “eu nunca recusei a Eucaristia a ninguém. A comunhão não é um prêmio para os perfeitos”.

O farisaísmo, a hipocrisia e a falsidade não tem vez com Jesus. Pelo contrário, Ele desmascara a estrutura lógica do pensamento das autoridades judaicas, que viam nas atitudes d’Ele, um perigo, já que Ele se considerava um profeta. Em outro momento de seu evangelho, Mateus registra uma fala bastante pertinente de Jesus, quando este se refere às autoridades judaicas: “Esse povo me honra com os lábios, mas o coração deles está longe de mim. De nada adianta eles me prestarem culto, porque ensinam preceitos humanos”. (M 15, 8-9) Os fariseus do tempo de Jesus e também os de hoje, são especialistas em hipocrisia. Falam, mas não fazem. Querem que os outros sigam aquilo que eles mesmos não seguem. Cobram dos outros, aquilo que a sua indiferença não é capaz de mover para mudar. Sinta-se chamado/a, lembrando daquilo que Ele mesmo disse ao final do Evangelho de hoje: “Aprendei, pois, o que significa: ‘Quero misericórdia e não sacrifício’. De fato, eu não vim para chamar os justos, mas os pecadores”. (Mt 9,13)