Sextou, dirão os mais eufóricos defensores da semana que está findando, encontrando motivos para festejarem com os amigos, de preferência tendo uma cerveja gelada por companhia. Mas para a Igreja, hoje é o dia de celebrar a Festa da Anunciação do Menino Jesus. Uma festa associada ao Natal, pois há exatos nove meses, Maria dará a luz ao seu tão esperado filho. Deus que adentra a história humana pelas portas da periferia, tendo por parceira uma mulher simples do meio do povo, encarnando-se através de uma inocente criança – Emanuel = Deus é conosco.
Festa da Anunciação do Senhor. Uma solenidade que tem referência direta no texto bíblico, quando Lucas, um especialista em narrar a infância de Jesus (1, 26-38), nos mostra a atuação de Deus na história, com a participação de uma mulher com o seu sim, contribuindo decisivamente para manifestar a grandiosidade do sim definitivo de Deus para com a humanidade. Todavia, somente por volta do século VI, no pontificado de Sérgio I, que esta solenidade foi introduzida no calendário litúrgico da Igreja, e celebrada todos os anos no dia 25 de março, prefigurando assim a Encarnação do Filho de Deus no seio da humanidade, por meio do sim espontâneo de Maria, a mulher que acreditou.
Da periferia para o mundo. Periferia não somente geográfica, mas social e existencial. Maria é o símbolo de todas as mulheres que aguardavam ansiosamente a vinda do Messias libertador anunciado, trazendo para dentro da história humana o projeto de salvação que Deus tinha revelado, conforme a promessa feita no Antigo Testamento. Ela é a digna representante da comunidade dos pobres que esperam pela libertação. Deus que faz questão de contar com a contribuição de uma mulher, justamente elas que eram consideradas um ser abjeto para a sociedade daquele tempo; não gozando de nenhum prestígio social, a não ser em objeto de desejo de seus donos (maridos), que, inclusive, quando não lhes servissem mais, poderiam emitir um documento e dispensá-las.
“Encontraste graça diante de Deus”. (Lc 1, 30) Maria foi a escolhida pelo próprio Deus para gerar em seu ventre o Verbo Divino. É no útero sagrado de uma mulher periférica, desprezada pelo patriarcado imperante, que Deus, através da ação do Espirito Santo, fará gestar a Semente da Esperança de uma nova história humana. Deus que revoluciona a história, dando valor aquela que vivia na marginalidade social. Tudo poderia dar errado, caso esta simples, decidida e corajosa mulher tivesse se negado a fazer parte do Projeto de Deus. Altiva e empoderada que era, Maria escutando a voz de Deus ecoar em seu coração, se entrega confiante em suas mãos: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra!” (Lc 1,38) O sim de Maria sincronizado com o sim de Deus que vem estar conosco, inaugurando uma nova história.
Maria, mulher forte e destemida. Enfrentou tudo e a todos. Desde o preconceito e a discriminação, até o julgamento cruel das mentes curtas moralistas, por aparecer grávida diante daquela sociedade machista, sem estar coabitando com homem algum. Certamente não foi de todo fácil dizer o seu sim a Deus, mas o fez na confiança e na entrega de si mesma, sabendo estar diante do Deus do impossível. Um sim manifesto não somente à Deus, mas em favor de toda a humanidade, uma vez que em Maria, Deus realiza o seu Projeto Salvífico no tempo e na história humana. A graça divina de Deus se fazendo presente em nós, por intermédio de uma mulher que aceitou integrar ao projeto de libertação trazido pelo Emanuel.
O sim e o não que fazem parte do nosso existir dialético. O sim dado por uma mulher nos mostra que também somos desafiados a tomar as nossas decisões. Cabe a cada um de nós fazermos as nossas escolhas, diante dos desafios que a vida nos oportuniza. O sim e o não fazem parte do existir humano entre o ser o não ser. Escolher entre aquilo que gera a vida, ou nos apegarmos aos projetos de morte. Como já nos dizia o Livro do Deuteronômio: “Eu lhe propus a vida ou a morte, a bênção ou a maldição. Escolha, portanto, a vida, para que você e seus descendentes possam viver”. (Dt 30,19) Que Maria, a mulher do sim decidido, nos ensine a dar o nosso sim pela vida, nossa e dos nossos! Como nos pede o próprio Jesus: “Diga apenas ‘sim’, quando é ‘sim’; e ‘não’, quando é ‘não’. O que você disser além disso, vem do Maligno.” (Mt 5,37)
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