Prof. Sergio A. Ribaric’, teólogo, escritor e palestrante.

A última menção a Maria no Novo Testamento, se encontra no livro do Ato dos Apóstolos. Ela aparece entre os discípulos que voltaram para Jerusalém e entre orações recebem o Espírito Santo, como cumprimento da promessa do Mestre.

Jesus ascende aos céus, Maria fica entre os discípulos, como provavelmente ficou durante os três anos de vida pública de seu filho, como testemunha da maior revelação de Deus na história.  O grupo dos “doze” era um grupo heterogêneo, de gente simples, vida dura…  não deve ter sido fácil o convívio entre eles devido a essas diferenças. Mas ela era a mãe. O elo de ligação entre eles e Jesus. Deve ter estado presente em cada ensinamento, em cada discurso, em cada milagre de seu filho. Deve ter percebido, com preocupação de mãe, o rumo trágico que os acontecimentos iam tomando.

O convivo entre pessoas, mesmo as “chamadas” por Deus, é difícil. Porque antes do convite de “segue-me” vinha um “deixe tudo” …. era preciso “se” abandonar. Aquela comunidade devia antes aprender a arte de amar “como” Jesus foi capaz de amar. E a presença de Maria nesse momento deve ter sido fundamental. O amor que Jesus nos convida deve ser vivido de modo diretamente proporcional às dificuldades: quanto maior for a dificuldade tanto maior será o amor gerado e corajosamente enfrentado com abertura e confiança. Jesus quis deixar ao mundo como herança uma comunidade onde é possível que o amor constitua o centro das atitudes, que as rege e oriente. A comunidade dos apóstolos que ficaram não foi uma comunidade ilusória, artificial, onde tudo funcionava e se compreendia perfeitamente, onde as tensões e diferenças humanas eram sufocadas de modo que pareciam não existir.

Jesus deixou aos discípulos a sua herança. Uma herança que consiste acima de tudo na busca do verdadeiro amor, de um amor que é fruto de uma decisão firme e fiel. Este é um amor objetivo, conhecido e experimentado dentro de uma vida vivida em comunhão. Pois quanto maiores os vínculos de uma convivência tanto mais as pessoas são estimuladas para perder algo de si mesmas, a entrar no mundo do outro. “Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei”. Quanto maiores forem as divergências, tanto maior será a força de amor capaz de ser gerada. É assim que Deus age! Quanto mais se desce nas profundezas do homem, mais se percebem suas limitações e pecados e sua incapacidade de, sozinho, optar pelo amor autêntico, profundo, real….

Esta é a grande e última recomendação de Jesus: “Amem-se como eu vos amei”; é como se Jesus continuasse: “façam o que eu peço, se fizerem isso, todos saberão quem sou eu”. O amor com o qual Jesus amou é um amor que entra em sintonia com a outra pessoa, entra no seu coração antes do que em seus gestos, erros ou limites. Esta é a missão da Igreja: revelar o que significa o amor de Jesus e mostrar que um amor assim “é possível”.

O papel dos leigos

Essa recomendação e convite de Jesus também foi uma missão a todos aqueles que O viram ressurrecto e não apenas aos 12 apóstolos que aos poucos formaram a primeira Igreja. Sair em busca do homem que não encontrou Deus, levar-lhe a “boa nova”, ensinar os passos do seguimento de Jesus, mostrar a todos a luz de uma vida nova é tarefa dos que O viram e O “ouviram”! Somente se conhecermos Cristo, se percorrermos juntos dele as suas estradas, se tivermos aprendido a conhecer a Sua voz, se Ele fala à nossa vida, se tivermos encontrado O Ressuscitado, somente então viveremos o mandato de tornar presente a Ressurreição no mundo de hoje.

«Eu estarei convosco todos os dias, até o final do mundo» (Mt. 28, 20).

Jesus usou a expressão, o “bom pastor”. Com isso sugere qual será a missão da Igreja e a missão daqueles que podem também serem chamados “bons pastores”. O Evangelho narrando a vida pública de Jesus nos sugere que é possível sim, encontrar o homem autêntico, confiável para ser um verdadeiro “pastor”. Não é sonho, fantasia. É possível sim um homem ser um pastor autêntico que conduz seus semelhantes a encontrar Jesus.

Jesus fala de «minhas ovelhas». É interessante que Jesus chame “suas” as ovelhas. Ora, isto se explica apenas com um modo de indicar uma relação: “pertencer” não é sinônimo de “possuir”, mas indica a relação de reciprocidade na responsabilidade. Ainda mais claro fica uma vez que o fato de sermos “posse”, ou seja, objeto da responsabilidade de Jesus, não existe nenhum mal capaz de “arrancar” uma ovelha da mão do Pai. Jesus nos dá uma infinita paz dizendo-nos: “Eu assumo a responsabilidade sobre você…”; como se nos dissesse: “não tenha medo, não se imagine à mercê de qualquer demônio ou força maligna, isto é impossível, Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos, e ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai”.

O ministro ordenado e todo cristão deve proclamar constantemente a Palavra de Deus. O homem não vive só de pão, mas antes de toda a Palavra de Deus. Dos resultados nefastos de uma vida vivida apenas de pão e da busca da felicidade no vazio de uma vida sem Deus, basta olhar para as estatísticas; Cada vez mais, há pessoas que têm tudo o que desejam, dinheiro suficiente para se vestir e comerem o que quiserem, e mesmo assim, UM dia, dizem: “Não posso mais viver”, “não aguento mais, não faz sentido essa vida”. O homem precisa de algo mais do que o pão, pois existe nele uma fome mais profunda: a fome de Deus, que só pode ser satisfeita com a Palavra de Deus. Uma Palavra que mais que conforto, traz ao homem a Sua própria presença, redentora e libertadora! Há um mundo inteiro sedento de Cristo.

A Igreja, os seminários, as congregações religiosas, especialmente no nosso caso, a Congregação do Santíssimo redentor (ou redentoristas) encontra e forma pessoas disponíveis com o próprio Ressuscitado, para que Este as conduza para as “verdes pastagens”, para a condição em que «será enxuta toda lágrima» do homem que sofre, que se sente sozinho. Exatamente porque existem pessoas que sofrem é que precisamos da fé, necessitamos da presença da Ressurreição e da vitória do amor; só o ressuscitado pode fazer surgir a estrela da esperança que vai permitir a continuidade da vida para muitos. Atuando em trabalhos voluntários que atingem a vida do próximo nas pastorais; nos movimentos e em missões fora da Igreja, os leigos redentoristas continuam a escrever, com louvores, o Ato dos Apóstolos (cf. Jo 13,12-17). Por isso, é necessário a cada ex seminarista “renovar seu carisma original” (DAp n.311). A obra necessita de cristãos com o coração extasiado pela paz do Senhor (cf. Jo 14,26-27). Esta é a grande missão que se abriu diante da Igreja nascente: serem portadores em sua vida da presença do Senhor Ressuscitado. “para que o anúncio divino da salvação seja conhecido e aceito por todos os homens, em todo o mundo” (CDC c. 225 §1).

“Portanto, sejam tecelões de comunhão, contra desigualdades, pastores atentos aos sinais de sofrimento do povo. Mesmo através do conhecimento que vocês estão adquirindo, sejam competentes e corajosos em levantar palavras proféticas em nome dos que não têm voz”(Papa Francisco, 07/02/2022)

O papel dos “ex´s”

As experiências vividas por cada um desempenham papel extremamente importante na vida das pessoas. Muitas dessas experiencias servem de alento, de força vital, de incentivo para caminhar, crescer, abrir-se ao mundo. Isso vale para os ex-seminaristas. Embora existam alguns que se tornaram ateus e revoltados contra a Igreja, carregando mágoas do tempo de seminário, outras (muitas) pessoas se comovem às lágrimas quando pensam nos idos da vida clerical, nos dias de seu “sim. No difícil dia de seu “não”….

Entre os ex-seminaristas é praticamente unânime o sentimento de gratidão por tudo que receberam durante o tempo de seminário. Receberam formação cristã, humana e ética que os fizeram melhores como seres humanos, pais de família e cidadãos. Entre eles há, hoje, professores, médicos, fazendeiros, empresários, comerciantes, bancários, engenheiros e muitos outros. Mas o sentimento para com a congregação do Santíssimo redentor é único: imensa gratidão!

Grupos de “ex´s”, como a união de ex seminaristas redentoristas (UNESER), perceberam sabiamente as grandes habilidades que essas pessoas adquiriram no tempo de seminário. Muitos deles conservaram boa formação religiosa e teológica e que não poderiam ficar dispersos mas, unidos, poderiam prestar valiosa contribuição para a comunidade e contribuir ativamente para o enriquecimento da vida da Igreja. Não é possível que essas imensas recordações positivas e de gratidão que cada um recebeu nos seminários, nos seus retiros e na sua vocação inicial se perca. A UNESER, chamando fraternalmente esse grupo disperso de ex seminaristas os convida a, novamente, percorrer os mesmos caminhos desses velhos tempos;  despertando a sua memória e  impulsionando o desejo de pôr em prática sonhos um dia acalentados.

“VEM E SEGUE-ME”

É um convite apaixonado e apaixonante. Um projeto de vida que brota de um momento de experiência do amor de Deus vivido por alguns. “Vem e segue-me: Fale o mesmo que eu falei. Faça o mesmo que eu fiz. Ame como eu amei!” (Jo 15,12-17)

Quase impossível a alguém, cristão e católico não ter ouvido ou melhor sentido esse chamado em algum momento de sua vida. Mas, abraçar o sacerdócio não é tarefa fácil. Tampouco destinado a todos. Os Evangelhos nos mostram isso. Jesus chamou apenas alguns….

Mas se o chamado ao sacerdócio foi destinado aos 12, a resposta a Jesus é de todos: “Mestre, eu te seguirei aonde quer que Tu vás” (Mt 8, 20).

Essa resposta é, sim, o que Deus espera de todos.

A missão redentorista nos lembra a cada momento que somos acima de tudo cristãos, seguidores de Jesus. A todos que nos perguntam e buscam conhecer esse homem chamado Jesus, nós, como Pedro, proclamamos: “Ele é o Cristo, o filho de Deus vivo” (Mt 16,13)

 

Glossário

Leigos: “Sob o nome de leigos entendem-se aqui todos os cristãos, exceto os membros das Sagradas Ordens ou do estado religioso reconhecido na Igreja, isto é, os fiéis que, incorporados a Cristo pelo Batismo, constituídos em Povo de Deus e a seu modo feitos participantes da função sacerdotal, profética e régia de Cristo, exercem, em seu âmbito, a missão de todo o Povo cristão na Igreja e no mundo” (CIC §897).

DAP: Documento de Aparecida

CDC: Catecismo da Igreja Católica