Sexta feira da Oitava da Páscoa. Sextou duplamente. Além de ser o sexto dia desta nossa caminhada Pascal, do Cristo vivo, presente entre e no meio de nós, sextou também pela primeira vez neste mês de abril. Lembrando que a Igreja Católica dedica o mês de abril a Eucaristia e também ao Divino Espírito Santo. Isto porque, quase sempre o Dia da Páscoa cai em abril. A Eucaristia é o centro da vida da cristã. Ela é o Sacrifício de Cristo que se atualiza e torna-se presente nas celebrações de nossas comunidades. A Eucaristia que é o Alimento (banquete) do Cordeiro, que se dá como alimento a todos e todas. A maior prova de amor de Jesus para conosco.
Tempo Pascal. Tempo de alegria. Tempo de esperançar na vida nova com Ele, mesmo que os tempos atuais, não sejam pascais. Nós aqui da Amazônia, estamos vivendo um grande dilema, particularmente a comunidade dos indígenas Yanomami. Uma triste notícia nos deixou consternados nesta semana. Isto porque, em nove aldeias no território Yanomami, foram encontradas contaminação por mercúrio, sendo que aqueles que vivem mais próximos dos locais de mineração ilegal de ouro, apresentaram níveis mais altos do metal, segundo um estudo realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Em 2022, a Fundação coletou amostras de cabelo de 287 indígenas. “Todas deram positivo para contaminação por mercúrio, com cerca de 11% das amostras apresentando altos níveis do metal, que é usado por garimpeiros para separar o ouro do minério e da terra”.
Para quem, tão somente, deseja o “Bem Viver”, em seus territórios originários sagrados, comunidades inteiras de Yanomami, estão ameaçadas pela invasão de criminosos garimpeiros, que promovem, não somente a mineração ilegal, mas também a morte de crianças e idosos inocentes. Um crime inafiançável, promovendo o genocídio dos povos originários. Os Yanomami, cuja população estimada é de 28.000 pessoas, vivem na maior reserva indígena do Brasil, nos Estados de Roraima e Amazonas. Eles enfrentam uma crise humanitária devido à invasão de suas terras por garimpeiros ilegais, o que tem causado desnutrição e mortes sucessivas.
Bem que a liderança indígena, Davi Kopenawa Yanomami, nos advertiu tempos atrás, com uma de suas falas proféticas: “A terra-floresta só pode morrer se for destruída pelos brancos. Então, os riachos sumirão, a terra ficará friável, as árvores secarão e as pedras das montanhas racharão com o calor. Os espíritos xapiripë, que moram nas serras e ficam brincando na floresta, acabarão fugindo. Seus pais, os xamãs, não poderão mais chamá-los para nos proteger. A terra-floresta se tornará seca e vazia. Os xamãs não poderão mais deter as fumaças-epidemias e os seres maléficos que nos adoecem. Assim, todos morrerão”. Já estamos vivendo para testemunhar as tragédias que se abatem sobre todos nós.
Mas deixando de lado as questões indígenas amazônicas, voltemos à liturgia do dia que nos apresenta nesta sexta feira, mais uma das aparições do Ressuscitado à comunidade dos discípulos. “Foi a terceira vez que Jesus, ressuscitado dos mortos, apareceu aos discípulos”. (Jo 21,14) Aos poucos, a rotina diária vai ganhando espaço na vida dos seguidores de Jesus. Mesmo abatidos e frustrados, eles retomam as tarefas que antes exerciam. Estando ali, à beira do mar de Tiberíades, com suas atividades pesqueiras, Jesus se coloca no meio deles e se dá a revelar. Rapidamente, o discípulo amado o reconhece e disse aos demais: “É o Senhor!” (Jo 21,7) O Kyrios ali diante dos olhos deles. Kyrios que é uma palavra de origem grega, que significa “Senhor”, ou “Mestre” e que é também utilizada como sinônimo de Deus ou Jesus entre os cristãos gregos. O discípulo a quem Jesus amava disse aos demais, que Jesus estava ali diante dos olhos de todos.
Mesmo estando ali, presente entre e com eles, só o reconhecem apenas no partir do pão e do peixe: “Jesus aproximou-se, tomou o pão e distribuiu-o por eles. E fez a mesma coisa com o peixe”. (Jo 21, 13) o Ressuscitado se fazendo Eucaristia, pão partilhado para saciar a fome física e todas as outras fomes: de justiça, igualdade, fraternidade, partilha, doação, serviço, movidos por um coração que saiba muito o que é amar na sua essência. Viram Jesus, sentiram-no e se revestiram de coragem e esperança de saber, que nem tudo estava perdido e que a vida tinha que ser continuada, praticando as mesmas palavras e ações de Jesus.
Lá como cá, Jesus também se faz presente, vivo e ressuscitado no meio de nós. Nem sempre o reconhecemos, como o fez o discipulado amado. Não somos capazes de reconhecê-lo, porque Ele se faz presente nas situações e circunstâncias mais inusitadas possíveis, como Mateus mesmo nos alertara: “Eu estava com fome, e vocês me deram de comer; eu estava com sede, e me deram de beber; eu era estrangeiro, e me receberam em sua casa; eu estava sem roupa, e me vestiram; eu estava doente, e cuidaram de mim; eu estava na prisão, e vocês foram me visitar”. (Mt 25,35-36) Quem vê Jesus apenas nos sacrários ou nos espaços “sagrados” de suas igrejas e não o vê nos rostos sofridos dos irmãos e irmãs da caminhada, precisa repensar a sua fé urgentemente, se quiserem fazer a sua opção pelo Ressuscitado, que vivo está no meio de nós.
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