Segunda feira da Terceira Semana da Quaresma. Estamos na metade dela. Entramos no vigésimo dia de uma caminhada “deserto” adentro, na procura de nossa conversão. Tempo suficiente para repensar a nossa caminhada até aqui, e ver que passos concretos conseguimos dar em direção a uma mudança radical de nosso modo de ser, viver, pensar e agir, familiarmente, eclesialmente e em sociedade. É certo que as mudanças geram inseguranças, incertezas, mas também nos preparam para o enfrentamento dos desafios, desde que estejamos abertos ao novo. Mudar é preciso! Neste sentido, serve-nos de inspiração uma das frases atribuídas ao líder indiano Mahatma Gandhi (1869-1948): “Seja a mudança que você quer ver no mundo”.
Conversão é missão de cada dia! Mirando a Palavra de Deus, deixamo-nos sermos moldados por ela, não somente no entendimento dela (mente), mas na sua prática cotidiana (coração). Coração na ação! A cada ano também, no período da Quaresma, devemos focar a nossa conversão, tendo em vista a temática sugerida pela Campanha da Fraternidade. Ela segue a Palavra de Jesus e neste ano também, a Encíclica do Papa Francisco: “Fratelli Tutti” (“Todos Irmãos”), sobre a Fraternidade e a Amizade Social. É muito importante a nossa participação como comunidade eclesial, e, social para que a Campanha da Fraternidade seja abraçada, anunciada e vivida por todos seguidores, seguidoras de Jesus de Nazaré.
Este mesmo Jesus que o evangelista São Lucas, no texto de hoje, o coloca retornando à sua cidade natal, Nazaré. Exatamente ali onde Ele passou sua infância e juventude. Nazaré que ficava a uma distância de aproximadamente 135 quilômetros de Jerusalém. A cidade se tornou famosa porque o anjo Gabriel anunciou o nascimento de Jesus naquele lugar (cf. Lc 1,27) a uma Virgem chamada Maria, prometida em casamento a um jovem chamado José (cf. Mt 1,18). Foi em Nazaré também que Maria disse o seu “sim” ao anúncio do Anjo. A pequenina aldeia de Nazaré é mencionada na Bíblia apenas no Novo Testamento, onde ganha destaque por causa do ministério messiânico de Jesus. Assim sendo, segundo o historiador judeu Flávio Josefo, o Novo Testamento é certamente a referência literária mais antiga sobre esta aldeia.
Jesus retornando à sua terra, entra na sinagoga, e fala ao povo abertamente. Este relato de hoje aparece nos três Evangelhos Sinóticos (Mc 6,1-6), (Mt 13,54-58) e (Lc 4,16-30). Todos eles afirmam que Jesus foi fortemente rejeitado pela população de sua cidade natal. Este incidente ocorre imediatamente após a Tentação de Jesus no deserto da Judeia. De acordo com os evangelistas, este fato acontece logo após Jesus ter iniciado o seu ministério público, antes da morte de João Batista. Jesus aparece entrando numa sinagoga em dia de sábado (sabbath). O texto de hoje omite a parte em que Jesus realiza a leitura das escrituras que trata de uma das profecias de Isaías (Is 61,1-2), em que Ele atribui a si mesmo aquela a realização daquela passagem.
Todos os evangelistas descrevem os concidadãos de Jesus questionando negativamente a origem de seus conhecimentos/ensinamentos, criticando-o por ser apenas um carpinteiro, ou o filho de Maria e José. Jesus rebate os argumentos deles: “Em verdade eu vos digo que nenhum profeta é bem recebido em sua pátria”. (Lc 4,24) Tal afirmação de Jesus aparece também no Evangelho de João (Jo 4,44) A rejeição a Jesus mostra claramente que os seus compatriotas não conseguiam ver n’Ele a pessoa do Verbo Encarnado, o Messias enviado. Todavia, como dizia o salmista: “A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular”. (Sl 118,22) Rejeitado pelos seus, Jesus se torna a pedra principal, escolhida por Deus para edificar a Igreja, conforme o seu plano divino.
Os questionamentos, as dúvidas e a rejeição de Jesus por parte de seus compatriotas fazem prever a hostilidade e a rejeição de toda a atividade de Jesus por parte de todo o seu povo. No entanto, Ele prossegue seu caminho, para construir o Reino, a nova história que envolve toda a humanidade: “Jesus, porém, passando pelo meio deles, continuou o seu caminho”. (Lc 4,30) Como estamos percorrendo o caminho da Quaresma, que este texto nos ajude a refletir sobre as nossas atitudes, posturas e decisões em relação a Jesus, não àquele que só o vemos no Sacrário das igrejas, mas o Jesus pobre, maltrapilho e com fome, que perambula pelas encruzilhadas da vida e nas periferias existenciais. Que saibamos reconhecer Jesus presente neles e não o rejeitemos como fizeram os conterrâneos do Nazareno.
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