Sábado da Décima Nona Semana do Tempo Comum. O terceiro final de semana de agosto chegou neste 230º dia do ano. Como sou ribeirinho, mais outros 136 dias nos levarão a aportar às margens do ano vindouro. Por aqui, nós antecipamos a Festa da Assunção da companheira Maria de Nazaré, mas para a Igreja Católica, esta Festa é celebrada no domingo seguinte ao dia 15 de agosto. Como somos discípulos de Jesus e de nosso bispo Pedro e, tendo Maria como Mãe, seguimos daqui, revitalizando o legado profético poético de nosso profeta: “Pela terra de lavoura dos Sem Terra. Pela casa em terra firme dos Sem Teto. Contra a terra-latifúndio, pervertida”.

Pedro vive! Seu legado nos inspira a continuarmos na luta pelos três “T”: Terra, Teto e Trabalho. A história desta Prelazia é marcada pelo engajamento sócio-político, e pelo compromisso com os empobrecidos aqui do “Vale dos Esquecidos”. Pedro nos ensinou a relativizar as nossas vidas, em função das causas maiores. Ele nos incentivava a “cair” dentro da luta, afirmando que: “Se não houver grandes causas, a vida não tem sentido”. O sentido da vida está nas causas que abraçamos e fazemos delas nosso projeto de vida. Foi assim que entendi o meu ser cristão, ao pisar os pés nesta terra vermelha, manchada de sangue, de tantos corpos que tombaram, e se fizeram os Mártires de nossa Caminhada. O espirito de Pedro está presente em todos aqueles e aquelas que “lavaram e alvejaram suas vestes no sangue do Cordeiro” (Apoc 7,14)

Um sábado especial, em que somos convidados a refletir sobre a participação das crianças no Reino de Deus, como os três versículos do Evangelho de Mateus do dia de hoje nos provocam. O texto de hoje foca na relação que Jesus estabelece com as crianças de seu tempo. Lembrando que as crianças não eram seres valorizados na cultura do tempo de Jesus. Aliás, em diversas culturas, as crianças não eram valorizadas e essa visão influenciou o povo de Israel. Os relatos históricos mostram que as crianças, quase sempre, eram tidas como de pouca importância na sociedade. Nem eram contadas. Sem nos esquecermos que elas também eram sacrificadas para acalmar a ira dos deuses, que acreditavam se manifestar em épocas de crises ou guerras, como fizeram os cananeus. (2Rs 16,3; 21,6; 23,10; Jr 7,31; 19,5; 32,35; Ez 16,21; Lv 20,2-5, 18,21).

A criança não era valorizada, não tinha nenhuma significação social. Os discípulos de Jesus, influenciados pela cultura judaica, incorporaram em seus comportamentos, atitudes que demonstravam este tipo de “preconceito” em relação às crianças, tanto que, tentaram impedi-las de entrarem em contato com Jesus, sendo veementemente repreendidos pelo Mestre: “Deixai as crianças, e não as proibais de virem a mim, porque delas é o Reino dos Céus”. (Mt 19,14) Jesus, não somente as acolheu de forma afetiva, carinhosa, como também relacionou-as à condição para àqueles que desejarem adentrar o Reino de Deus, deveriam passar por elas. No dizer de Jesus, uma das portas do Reino que se abrem, está relacionada diretamente às crianças.

Este mesmo texto de Mateus tem o seu paralelo no Evangelho de Marcos (Mc 10,13-16). O acréscimo deste segundo evangelista, nos ajuda a melhor entender a proposta de Jesus: “Eu garanto a vocês: quem não receber como criança o Reino de Deus, nunca entrará nele”. (Mc 10,15) A criança servindo de exemplo não pela sua ingenuidade inocente, ou pela sua perfeição ética, moral. Ela é o símbolo do ser fraco, sem pretensões sociais: é simples, não tem poder nem ambições. A criança é, portanto, o símbolo do pobre marginalizado, que está vazio de si mesmo, pronto para receber o Reino. “Dos lábios das crianças firmaste o teu nome como fortaleza, por causa dos teus adversários, para silenciar o inimigo que busca vingança”. (Sl 8,3)

“Eu te louvo, Pai, Senhor do céu e da terra, porque escondeste essas coisas aos sábios e inteligentes, e as revelaste aos pequeninos. (Mt 11,25) Deus se revelando na sua gratuidade aos pequeninos, pobres e marginalizados. Com sua palavra e ação, Jesus revela a vontade do Pai, que é instaurar o Reino. Todavia, os sábios e inteligentes não são capazes de perceber a presença do Reino e sua justiça passando pela vida de Jesus. Ao contrário, os desfavorecidos e os pobres é que conseguem penetrar o sentido dessa atividade de Jesus e continuá-la. Com sua encarnação em nossa realidade histórica, Jesus veio tirar a carga pesada que os sábios e inteligentes (inclusive da religião) colocaram sobre o povo simples. Jesus inverte esta lógica perversa dos poderosos, trazendo um novo modo de viver na justiça e na misericórdia. Daí em diante, os pobres são evangelizados e partem para evangelizar, com o seu jeito de ser e viver. Deixemos que a nossa criança interior seja protagonista das nossas ações, para construirmos assim relações mais amorosas e fraternas, com a simplicidade características delas.