Quarta feira da 29ª Semana do Tempo Comum. Estamos a caminho do final do mês missionário. Se bem que, ser missionário é constitutivo da vocação de todo cristão. Missão que é para toda vida, onde quer que estejamos. Pelo Sacramento do Batismo, somos chamados e enviados em missão “para onde Ele mesmo devia ir”. (Lc 10,1) Diante deste contexto, que tenhamos a coragem e a determinação que teve o profeta Isaías: “Ouvi, então, a voz do Senhor que dizia: “Quem é que vou enviar? Quem irá de nossa parte? Eu respondi: Aqui estou. Envia-me!” (Is 6,8) Sempre com a certeza de que não estaremos sozinhos, mas com a presença viva d’Ele e seu Espírito, a nos conduzir e proteger.
Mais uma quarta feira triste para a Caminhada da Igreja Latino Americana. Faleceu nesta terça feira (22), em Lima (Peru) aos 96 anos, o teólogo Gustavo Gutiérrez Merino (1928-2024). Presbítero dominicano, defensor dos pobres e da Igreja dos pobres. A Teologia da Libertação está órfã, já que ele era considerado o “Pai da Teologia da Libertação”. Com ele aprendemos, através de seus muitos livros publicados, que a teologia deve ser crítica e libertadora, situada no contexto histórico dos pobres e oprimidos. Aprendemos também que a função principal desta Teologia, não é apenas interpretar o mundo, mas transformá-lo à luz do Evangelho. Por este motivo, recebeu muitas críticas e perseguições, inclusive de dentro da própria Igreja.
Sua humildade, simplicidade e austeridade, falavam por si. Sua fidelidade no seguimento de Jesus de Nazaré, o fez amigo dos pobres e por eles deu a sua vida. Não se prendeu ao dogmatismo clerical, a começar pelas suas vestes simples, mas se fez com e para os pobres junto deles pela sua libertação. De inteligência rara, lecionou nas maiores universidades do mundo, sem deixar de ser o homem simples que era. Teve uma participação e contribuição decisivas para com as Conferencias Episcopais Latino Americanas de Medellín (1968) Puebla (1979) Santo Domingos (1992) e Aparecida (2007). Sempre trazendo junto consigo a afirmação: “O compromisso com o pobre não pode evitar a denúncia das causas da pobreza”
“O Deus da vida”, este foi um dos livros de Gutiérrez que li, lá pelos idos de 1989, e muito me impressionou. Aliás, foi este livro que serviu como inspiração para a minha Ordenação Presbiteral, ocorrida em minha cidade natal (Montes Claros), em 03 de dezembro de 1989. Ali abracei de vez a Teologia da Libertação, delineando assim o meu roteiro pela vida afora. Ali ficou claro para mim que, mais importante que caridade, o bom mesmo, é a fidelidade fraterna solidária com as causas dos pequenos. A caridade pode até dar de comer a quem tem fome, mas a solidariedade faz a mesma coisa e ainda se preocupa em responder o porquê da fome, bem na linha pedagógica solidária de Dom Hélder Câmara: “Quando dou comida aos pobres, me chamam de santo. Quando pergunto por que eles são pobres, chamam-me de comunista”.
Ficai preparados! Porque o Filho do Homem vai chegar na hora em que menos o esperardes”. (Lc 12, 40) Este é o grande alerta feito por Jesus aos seus discípulos, e que serve para todos nós ainda hoje. Atitude de espera, mas em prontidão. Fidelidade no compromisso de estar sempre atentos, mas fazendo acontecer o que se espera de nós. A hora de Deus é diferente da nossa. O tempo de Deus (Kairós) não é o mesmo nosso (Chronos). Enquanto o nosso tempo é calculado, medido pelo passar das horas do relógio, o Kairós é o temo oportuno, que faz os acontecimentos serem especiais, memoráveis, não em números, que podem ser controlados, mas em significância, como momento oportuno, certo, único. Bem que o salmista nos alertou: “Espera pelo Senhor, tem bom ânimo, e fortifique o seu coração; espera, pois, pelo Senhor”. (Sl 27,14) Deus não erra a sua hora! Se temos esta convicção em nosso coração, estamos alimentados de esperança.
Fidelidade solidária de quem está sempre pronto para servir. Esperar continuamente pela chegada imprevisível do Senhor. Enquanto Ele não vem, estejamos atentos, vigilantes e servindo os que mais necessitam de nossos cuidados. A hora de Deus vai chegar para nós! Enquanto isso, seja o nosso serviço uma busca incessante pelo Reino, através da prontidão no serviço fraterno aos irmãos. “Feliz o empregado que o patrão, ao chegar, encontrar agindo assim!” (Lc 12,43) Fidelidade e prontidão de quem está disposto a servir. Com Gustavo Gutiérrez descobri que o único caminho para ser solidário com os pobres, é ajuda-los a serem sujeitos do seu próprio destino, senão não tenho como dizer-lhes que Deus os ama, “quando a sua própria vida é a negação do amor”.
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