Sábado da trigésima primeira semana do Tempo Comum.
A primeira semana do mês de novembro vai chegando ao fim. Vamos-nos adequando as circunstâncias do momento. Lá fora o clima ainda é tenso e já começam a faltar gêneros de primeira necessidade. Alguma coisa está muito errada. Quando um cinegrafista é duramente atacado, no exercício de seu trabalho, pelo simples fato de estar usando uma camisa vermelha, é sinal de paranoia e esquizofrenia. Vendo tudo isso, eu também aderi ao movimento. Quero também a intervenção: intervenção psiquiátrica já! Se bem que, como nos disse Ariano Suassuna: “O fanatismo e a inteligência nunca moram na mesma casa”.
Meu amanhecer deste sábado foi no túmulo do profeta do Araguaia. Fui rezar e buscar inspiração para permanecer firme na resistência e teimosia, tão peculiares na vida deste nosso eterno bispo da Prelazia. Um bando de periquitos também se fez presente com a sua algazarra infante. Contemplei a natureza se refazendo e as águas do Araguaia desfilando em direção ao Rio Tocantins. As nuvens não permitiram o sol reinar absoluto desde cedo, adiando o seu brilho entre nós. Contemplar o sol é manter a postura de quem deixa literalmente as sombras ficarem para trás.
O cristão seguidor de Jesus é filho e filha da indignação. Foi assim que Pedro nos ensinou a conservar-nos fieis na observância e vivência evangélica. Para justificar este espírito de indignação em Pedro, vasculhei um de seus escritos e ali encontrei: Indignação por ver que alguns se julgavam donos da terra e de seus bens e espoliavam povos indígenas dos territórios que secularmente ocupavam, e expulsavam famílias que há décadas cultivavam o solo, para alimentar sua família”. Indignação e compromisso com as causas dos mais necessitados. Insistir, persistir resistir e nunca desistir! Este é o nosso lema na fidelidade às mesmas causas de Jesus.
Fidelidade é a grande temática da vida cristã. Ser fiel é a atitude de quem se coloca no seguimento dos passos de Jesus. Cada dia sendo exigido algo mais para darmos conta desta fidelidade. De fracasso em fracasso, mas de esperança em esperança, vamos avançando junto à “Testemunha Fiel”. Fidelidade que nem sempre esteve presente na vida de alguns dos nossos na caminhada de Igreja povo de Deus. Neste sentido o Papa Francisco até nos alerta numa de suas homilias: “Tenham cuidado com os rígidos. Tenham cuidado com os cristãos – sejam eles leigos, padres, bispos – que se apresentam como ‘perfeitos’, rígidos. Tenham cuidado. Não há o Espírito de Deus ali. Falta o espírito da liberdade”. Esse Papa!
Fidelidade que é também a temática apresentada pelo texto do evangelho da liturgia do dia de hoje. Num dado momento, Jesus é muito claro no seu ensinamento: “Quem é fiel nas pequenas coisas também é fiel nas grandes, e quem é injusto nas pequenas também é injusto nas grandes”. (Lc 16, 10) Ser fiel é um exercício diário ao qual somos submetidos. Jesus nos mostra que é impossível ser fiel nas grandes coisas, quando somos negligentes nas pequenas. A coerência se faz necessária na nossa caminhada de fé, a partir das pequenas coisas, dos pequenos gestos, das atitudes tomadas visando o serviço gratuito das nossas relações.
“O preço da fidelidade é a eterna vigilância”, nos dizia Millôr Fernandes.
Doação e serviço são as duas faces de uma mesma moeda na experiência de fé de quem caminha com Jesus. De fidelidade em fidelidade. Assumindo a fidelidade e expulsando de nós o compromisso com a infidelidade, pois o próprio Jesus também adverte: “Ninguém pode servir a dois senhores”. (Lc 16,13) Servir aos deuses do mercado é uma grande infidelidade. Ou se serve ao Deus verdadeiro, ou se serve ao deus dinheiro, uma antiga divindade das riquezas da mitologia fenícia. A “Mamona” é o deus mercado. Os adoradores deste deus não possuem nem misericórdia nem compaixão. O deus que anima o culto destes adoradores é o dinheiro, e os ídolos ouro e prata, como o salmista assim já o dissera: “Os ídolos deles são prata e ouro, obras de mãos humanas”. (Sl 115,4)
No contexto de hoje Jesus está ensinando aos seus discípulos e ao mesmo tempo falando para os fariseus. Esta classe de gente é exímia em disfarçar a própria ambição com observâncias externas, mas não são nada justos diante de Deus. Não há meio termo, ou se serve a Deus ou serve a outras divindades. Toda pessoa humana possui em si o valor fundamental, um absoluto que determina toda a sua forma de ser e viver. Qual é o seu absoluto: Deus ou as riquezas? Devemos nos lembrar que Deus leva a pessoa à liberdade e à vida, através da justiça que gera a partilha e a fraternidade. As riquezas são resultado da opressão, da cobiça e da exploração, levando as pessoas à escravização e à morte. É preciso escolher a qual dos dois queremos servir. E aí, já escolheu de que lado você quer estar?
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