Categories: Reflexões Bíblicas

Domingo de Ramos (Chico Machado)

Domingo de Ramos. Enfim chegamos ao final da jornada da quaresma: quarenta dias fazendo um percurso na busca de nossa conversão (Metanoia), rumo à Páscoa do Cristo Ressuscitado. Este domingo é o portal que se abre para que possamos vivenciar mais uma vez a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus de Nazaré. A Igreja quer que todo o nosso caminhar, neste tempo quaresmal, seja pensado na perspectiva de acompanhar os passos de Jesus à caminho do calvário. O Filho de Deus, sem mancha e sem pecado, sendo assassinado como um malfeitor subversivo, pendurado numa cruz. Ainda bem que a morte não é detentora da última palavra: “Por isso, Deus o exaltou grandemente, e lhe deu o Nome que está acima de qualquer outro nome”. (Fp 2,9)

Um sábado também especial para a caminhada de nossa Igreja Latino americana. No dia de hoje, fazemos a memória do martírio de Santo Oscar Romero (1917-1980). Oscar Arnulfo Romero Y Gadamez nasceu em 15 de agosto de 1917, em Ciudad Barrios, em El Salvador. Foi um sacerdote católico salvadorenho, quarto arcebispo metropolitano de San Salvador, capital de El Salvador. No dia 24 de março de 1980, Dom Romero foi fuzilado, em meio aos doentes de câncer e enfermeiros, enquanto celebrava uma missa na capela do Hospital da Divina Providência, na capital de El Salvador. Dom Oscar, foi fiel a Igreja, e pagou com a vida o preço de ser discípulo fiel de Jesus de Nazaré. O seu nome foi incluído na relação dos 1015 salvadorenhos que foram assassinados, naquele ano de 1980 no país salvadorenho.

O tempo litúrgico é quaresmal, mas em tempo de celebrar também os 70 anos do poeta, trovador, menestrel da Igreja pé no chão na caminhada: Zé Vicente. Zé é natural de Orós, Ceará, grande compositor das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Há quarenta e três anos anima as nossas comunidades com as suas canções, afinal ele canta e nos encantam desde 1981, fazendo de suas criações e voz, expressão de identidade e afirmação cultural, não só para o povo brasileiro, mas também para os povos dos lugares por onde tem passado, na América Latina, na Itália, na África do Sul. Zé Vicente é um artista nato, cidadão, ecologista, místico. Um apaixonado pelas comunidades e sua terra natal. Tenho a grata felicidade de acompanha-lo ao longo do Curso de Verão e também como integrante que sou do Movimento dos Artistas da Caminhada (Marca). Parabéns, Zé nosso poeta trovador!

A liturgia deste Domingo de Ramos é extremamente rica de detalhes, que precisamos estar atentos para acompanha-los e não perder nenhuma de suas nuanças. Como o evangelista João é aquele que tem o firme propósito de responder a pergunta “Quem é Jesus?”, ele o faz apresentando as ações concretas de Jesus (sinais). No texto de hoje, Marcos nos apresenta a chegada “triunfal” de Jesus em Jerusalém, sendo acamado pelos pobres e marginalizados, que o receberam com ramos nas mãos e estendendo suas vestes sobre o chão, para que Jesus pudessem passar, montado em um jumentinho. Esta ação, contraria assim a expectativa que existia na concepção judaica que esperava a chegada de um Messias que fosse, de fato, acabar com a hegemonia da dominação romana na região.

Depois da recepção, Marcos se ocupa em relatar para nós todo o processo para se chegar à condenação de Jesus, nas mãos das lideranças religiosas locais. Roma era quem comandava as diretrizes, politicas, econômicas e religiosas da época. Sob a dominação romana, o Sinédrio, o tribunal dos antigos judeus, em Jerusalém, composto de sacerdotes, anciãos e escribas, o qual julgava os assuntos criminais e administrativos, podia condenar à morte, mas não podia executar a sentença. Por isso, Jesus é entregue ao governador romano, sob a falsa acusação de ser um perigoso subversivo político, que pretendia retomar o reino judaico contra a dominação romana. O processo diante de Pilatos é também uma grande farsa dominada pelos interesses de ambas as autoridades.

Jesus caminha para a cruz, ciente de que as forças da morte não suportam conviver com a verdade e com a vida que Deus quer para todos. Ele sabe que a cruz é consequência de sua fidelidade ao projeto de ternura, compaixão e amorosidade do Pai, que quer que todos vivam, e vivam bem! Todavia, nas mãos de Deus, Jesus esvazia-se totalmente de si mesmo, entregando confiante nas mãos de Deus, como Paulo o define belamente neste seu texto cristológico: “Ele esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo e tornando-se igual aos homens. Encontrado com aspecto humano, humilhou-se a si mesmo, fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz”. (Fp 2,7-8)

Jesus, embora tivesse a mesma condição de Deus, apresentou-se entre os homens como simples homem. E mais: abriu mão de qualquer regalia ou privilégio, tornando-se apenas homem que obedece a Deus e serve aos demais homens. Não bastasse isso, Jesus serviu até o fim, perdendo a honra ao morrer na cruz, como se fosse criminoso terrível. Por isso Deus o Ressuscitou e o colocou no posto mais elevado que possa existir, como Senhor do universo e da história. Este texto de hoje nos convida a fazer o mesmo no nosso dia a dia: abrir mão de todo e qualquer privilégio, até mesmo da boa fama, para pôr-nos a serviço dos outros, até o fim, com todas as consequências que daí decorre. Como bem disse o nosso Papa Francisco recentemente: “Ter fé não significa estar livre de momentos difíceis, mas ter a força para os enfrentar sabendo que não estamos sozinhos”.

Luiz Cassio

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