Segunda Semana da Páscoa. Iniciamos esta semana com a Solenidade da Anunciação do Senhor. A fundamentação bíblica para esta festa encontra-se no Evangelho de Lucas (Lc 1,26-38). Solenidade esta que destaca o “sim” de Maria ao projeto salvífico de Deus. A Anunciação do Senhor é a solenidade por excelência, que expressa a vontade divina do querer de Deus em dar-se a conhecer a humanidade, salvá-la e, ao mesmo tempo, a disponibilidade do ser humano em acolher essa auto-revelação divina. O episódio narrado por Lucas quer nos mostrar a origem histórica do problema enfrentado pelas primeiras comunidades cristãs acerca da encarnação do Verbo de Deus no ventre maternal de Maria.
A Anunciação é a Solenidade que vem realçar para nós a natureza humana de Jesus. Divino e humano se fundindo na pessoa de Jesus de Nazaré, tendo como porta de entrada o ventre de uma mulher pobre da periferia de Nazaré. Divino e humano coabitando mutuamente, em plena união hipostática, ou seja, a união da natureza divina e da natureza humana na pessoa de Jesus Cristo. O pequeno e humilde filho do casal, Maria e do carpinteiro José de Nazaré era, na verdade, o verdadeiro Filho de Deus, encarnando na história humana pela ação de Deus. Nesta ação, Maria se torna a “Theotókos”, palavra grega que diz exatamente “Mãe de Deus”.
Não é desde sempre que esta solenidade é celebrada na Igreja. Somente em 431 d.C., no Concílio de Éfeso, que a Igreja proclama solenemente Maria como Mãe de Deus (Theotókos), defendendo assim, a real Encarnação do Filho de Deus no seio da humanidade, por meio do sim de Maria. Tal decreto foi oficializado no concílio de bispos cristãos, convocado em Éfeso (perto do atual Selçuk na Turquia), na Ásia Menor, realizado em 431 pelo imperador romano Teodósio II, resultando posteriormente na instituição da festa litúrgica da Anunciação do Senhor. Entretanto, a Igreja, por volta do século VI, no pontificado de Sérgio I (687-701), introduziu definitivamente, no calendário litúrgico da Igreja Católica Romana, a solenidade da Anunciação do Senhor.
Lucas é por excelência o evangelista que nos apresenta o caminho de Jesus como caminho que se realiza na história humana. Para percorrê-lo, Jesus, o Filho de Maria e do Altíssimo, se faz natureza humana em Jesus de Nazaré (cf. Lc 2,1-7), trazendo para dentro da história humana o projeto de salvação que Deus tinha revelado, conforme a promessa feita no Antigo Testamento: “Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, porque visitou e redimiu o seu povo. Fez aparecer uma força de salvação na casa de Davi, seu servo; conforme tinha anunciado desde outrora pela boca de seus santos profetas”. (Lc 1,68-70). O caminho de Jesus inicia o processo de libertação na história, e por isso realiza uma nova história, que é a história dos pobres e oprimidos que são libertos para usufruírem a vida dentro de novas relações entre as pessoas.
Ao ser comunicada, Maria disse “Sim” ao chamado de Deus e se coloca a disposição para realizar o seu projeto de amor para a humanidade. A Mãe de Jesus se torna a “Mãe de Deus” (“Theotókos”) e nossa. Mesmo sem entender direito tudo aquilo que estava acontecendo em sua vida, com a Encarnação do Verbo de Deus. O “Sim” confiante e consciente de Maria, se faz sim na sintonia de Deus em favor da humanidade. Em e por Maria, Deus realiza o seu projeto salvífico no tempo e na história humana. “Alegra-te, cheia de graça, o Senhor está contigo!” (Lc 1,28). Maria, a cheia de graça é aquela que nos abre as portas da Graça. Somos todos e todas agraciados pela Mãe de Deus, que se faz também de todos nós, da humanidade inteira.
É bom que saibamos que, no tempo de Jesus, a mulher não gozava de nenhum prestígio. Eram consideradas como seres inferiores e sem crédito. Deus se faz valer de uma mulher para mostrar-nos o diferencial delas na vida de todos nós. Desta forma, Maria se torna a representante da comunidade das mulheres e dos pobres em geral que esperam e anseiam pela libertação. Em seu ventre, Deus faz nascer Jesus Messias, o Filho de Deus. Já o fato de Maria conceber sem ainda estar morando com José indica que o nascimento do Messias é obra da intervenção divina de Deus na vida do casal. Isto que dizer que aquele que vai iniciar a Nova História surge dentro da História de maneira totalmente nova. Assim são as “coisas” de Deus em nossas vidas também. Celebrar a solenidade da Anunciação do Senhor é dar graças a Ele por tudo aquilo que nos veio pelo “Sim” de Maria. A Solenidade da Anunciação do Senhor nos faz contemplar a salvação de Deus realizada no sim de uma Mulher, o sim de Deus, por meio de uma Mulher. E que Mulher.
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