Quarta feira da 30ª Semana do Tempo Comum. Estamos a um passo de findar a etapa do décimo mês deste ano. Nosso coração segue esperançando em dias melhores. Se cada um de nós, em nome da amorosidade, da ternura e da compaixão, se ocupasse em dar o melhor que há em si, certamente teríamos um mundo bem melhor para vivermos. A vida é feita de escolhas. Cada um de nós tem a oportunidade de decidir sobre aquilo que esperança em seu coração: desistir, ceder ao acaso, ou dar o melhor de si, diante de suas potencialidades e possibilidades que a vida se lhe apresenta. A paz da consciência é o maior de todos os conselheiros.
Uma quarta feira que começou bastante cedo para este que voz escreve. Depois de uma tarde/noite, cheia de expectativa de que a chuva cairia em profusão, à manhã iniciou com o Astro-Rei regendo absoluto. Rezei as margens do Araguaia, contemplando o alvorecer da esperança, de mais um dia como dádiva do Criador. Sempre me senti um privilegiado por estar aqui, e poder beber na fonte de todas as maravilhas que o Araguaia nos proporciona. “Araguaia, meu Araguaia, de mistérios e de temor”. Minhas raízes estão fincadas radicalmente nestas terras, e é aqui que eu sei ser feliz. Como dizia-nos nosso bispo Pedro: “A palavra radical vem de raiz, e quanto mais fundo eu vou, mais forte sinto minhas raízes”.
Muito cedo também, me pus ativo na arte de rabiscar. Tudo porque o dever me chama para ajudar no processo formativo dos professores Xavante do Território Indígena de Marãiwatsédé (168 mil hectares). Professores que atuam em todas as escolas presentes nas aldeias. Todos, muito ávidos de saber mais, para poder transmitir mais, acerca da Educação Escolar Indígena. Dá gosto de trabalhar com eles, sobretudo porque se fazem muito atentos, ao que lhes é repassado em forma de conhecimento, já que os saberes tradicionais ancestrais, eles dominam amplamente. Nesta relação de troca de saberes, confesso que mais aprendo que ensino, comprovando aquilo que já nos disse nosso educador maior Paulo Freire, em sua obra Pedagogia do Oprimido: “não há saber mais ou saber menos, há saberes diferentes”.
Saberes que também aprendemos com Jesus, com sua pedagogia libertadora. Hoje, mais uma vez, Ele se ocupa em ensinar seus discípulos e a multidão que o rodeia. Lembrando que Lucas contextualiza Jesus, que está seguindo o seu caminho rumo a Jerusalém, lá onde ficava o centro nevrálgico do poder econômico e religioso da época. Num dos registros do evangelista Mateus, inclusive, ele descreve a cidade de forma bastante crítica, numa das falas de Jesus sobre ela: “Jerusalém, Jerusalém, que mata os profetas e apedreja os que foram enviados a você! Quantas vezes eu quis reunir seus filhos, como a galinha reúne os pintinhos debaixo das asas, mas você não quis!” (Mt 23,37) Ou seja, Jerusalém personifica o sistema que se fechou em si mesmo, e recusou a novidade trazida por Jesus. Por isso, seu destino já está traçado: em Jerusalém ele vai ser morto, e sua morte trará o julgamento definitivo sobre ela.
Em meio aos ensinamentos de Jesus, alguém anônimo na multidão lhe faz uma pergunta no mínimo curiosa: “Senhor, é verdade que são poucos os que se salvam?” (Lc 13,23) Inicialmente, Jesus não lhe responde diretamente, mas faz a comparação com as portas que aparecem nas nossas vidas. São muitas delas, que se abrem e fecham, mas Jesus observa que devemos adentrar pela porta estreita: “Fazei todo esforço possível para entrar pela porta estreita. Porque eu vos digo que muitos tentarão entrar e não conseguirão”. (Lc 13,24) A porta estreita, certamente é a do compromisso com o Reino, que se expressa pelo amor, dedicação doação, serviço, justiça, perdão, sempre permeados pela misericórdia e pela compaixão sem limites, assim como Deus é, em relação a nós. A condição é entrar pela porta estreita, isto é, escolher o caminho de vida que cria novas relações de fraternidade, partilha e igualdade entre todos.
A salvação é oferecida por Deus a todos e todas universalmente e indistintamente. Entretanto, abraçar esta salvação, é uma decisão que parte de nós, quando escolhemos entrar pela porta estreita. Não basta conhecer Jesus, achando que isto nos abrirá a porta estreita. Não basta também achar que as muitas Missas “assistidas” e as comunhões piedosas, no cumprimento dos deveres devocionais, nos aproximarão da porta estreita de que fala Jesus. É preciso seguir os passos do Nazareno, pelas veredas das nossas vidas. Alguns até acharão que, pelo simples fato de estarem o tempo todo paparicando o padre ou o bispo, lhes colocarão dentro da porta estreita. Ledo engano, confirma o próprio Jesus: “há últimos que serão primeiros, e primeiros que serão últimos”. (Lc 13,30) Uma forma de entrar pela porta estreita, é nos perguntamos frequentemente: o que Jesus faria se estivesse Ele no meu lugar no aqui e agora dos meus desafios cotidianos? A salvação não é questão de pertencimento, mas de fé e adesão consciente ao projeto de Jesus.
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