Anunciar o Evangelho (Chico Machado)

Sábado da Oitava da Páscoa. Já estamos quase concluindo esta primeira etapa da oitava pascal, sendo que este período se estende até o Dia de Pentecostes, quando então, o Espírito vem fazer companhia aos apóstolos. Estamos às vésperas da Festa da Misericórdia, que é celebrada no primeiro domingo depois da Páscoa. Esta festa foi instituída pelo Papa João Paulo II, em 2000, para toda a Igreja, estabelecendo que a partir de então, o Segundo Domingo da Páscoa passaria a chamar Domingo da Divina Misericórdia. Portanto, neste ano do Jubileu de Esperança, esta festa completa 25 anos. Lembrando que para este jubileu, o lema é “Coloquem a esperança na Minha misericórdia”.

“A esperança é um ato de rebeldia”. É desta forma que o nosso bispo Pedro definia o seu esperançar. Nesta manhã de sábado, fui atrás deste esperançamento, realizando um momento de mística, ao lado do túmulo do poeta e profeta do Araguaia. Comigo estavam presentes alguns professores e alunos/as do curso de Geografia da UFMT, do Campus de Barra do Garças. Ali, iniciamos o nosso instante, orante, bebendo da espiritualidade dos Mártires da Caminhada, ouvindo uma das canções de Pedro, musicada pelo colega de teologia no ITESP, Cirineu Kum: “Ruah, Vento de Deus”. “Tu que sopras onde queres, Vento de Deus gerando vida, Sopra-me, sopra-me… Leva-me em Boa Notícia sobre os telhados do medo. Passa-me em torno das flores Beijo de graça e ternura”.

Dentre em pouco, fomos acompanhados testemunhalmente pelo sol que, graciosamente, veio ressurgindo de dentro da Ilha do Bananal. Seus primeiros raios já anunciavam que este seria mais um daqueles dias, em que há um sol para cada um. Um momento mágico, confessou-me ao ouvido, a professora, extasiada diante da energia que emerge daquele lugar sagrado. Pedimos a intercessão do profeta, para que sejamos testemunhas de esperança, na luta de vidas pela vida, numa sociedade marcada pela injustiça, presente na desigualdade. Saímos dali fortalecidos, respirando a esperança teimosa de Pedro, desejosos de somar com ele quando diz: “Não poder nada. Não pedir nada. E, de passagem, não matar nada; não calar nada. Somente o Evangelho, como uma faca afiada”.

Um sábado diferente, como a muito não vivenciávamos. Na manhã deste dia 26, foi sepultado na Basílica de Santa Maria Maggiore, em Roma, o Papa Francisco. Ele que se torna o primeiro pontífice em cerca de 100 anos a ser enterrado fora do Vaticano. Um cortejo fúnebre levou o caixão do papa para a igreja. Foi ele mesmo que pediu para ser enterrado lá. O funeral aconteceu na Praça de São Pedro, no Vaticano. Cerca de mais de 250 mil pessoas, além de centenas de chefes de Estado, acompanharam o cortejo que terminou por volta do meio-dia (7h em Brasília). Francisco, que viveu com simplicidade, desejou também descansar em paz do mesmo modo: com um túmulo no chão e uma única palavra como epitáfio: “Franciscus”.

O Papa dos pobres, que soube viver com intensidade e levar adiante a Boa Nova do Evangelho, que no dia de hoje somos todos e todas desafiados a levar adiante, através de nosso testemunho fiel. No contexto litúrgico deste sábado, vemos Jesus dando continuidade às suas aparições. Desta vez, quem faz o relato é o evangelista Marcos. Na verdade, ele faz uma síntese de todas as aparições, através de um texto considerado pelos exegetas como um acréscimo posterior, já que difere um pouco das características deste evangelista. Como o Evangelho de Marcos é bem mais curto que os demais, estamos diante dos últimos versículos do capitulo 16 do segundo Evangelho. Jesus que aparece primeiro para Maria Madalena e ela se encarrega de anunciar este grande momento, diante dos descredito total dos demais seguidores de Jesus, que estavam de luto e chorando ainda a morte do Mestre. Testemunho de uma mulher de quem havia sido expulso sete demônios. Não dá para acreditar, pensaram eles.

Jesus aparece agora diante de todos os seus seguidores. Curiosamente o texto fala que Jesus aparece num momento em que eles estavam reunidos comendo. As primeiras palavras ditas por Jesus foi para repreendê-los, por causa da sua falta de fé (coração endurecido) e de não terem acreditado nas palavras daqueles, aos quais Ele havia aparecido como Ressuscitado. Mas as palavras seguintes de Jesus os empoderam na realização da missão que teriam dali por diante: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura!” (Mc 16,15) Anunciar a Boa Nova, não com palavras apenas, mas com o testemunho fiel da fé, nos gestos concretos, nas atitudes, na prática da justiça, na vivência do amor misericordioso, na realização e construção do Reino de Deus aqui e agora na história. A Boa Nova precisa chegar a todos e todas. Anunciar Jesus não é falar dos púlpitos das igrejas, mas estar presente na luta cotidiana por uma sociedade mais justa, fraterna e igual, onde reine a paz que é fruto da justiça. Que Francisco nos ajude a encontrar este caminho que nos leva ao encontro do Ressuscitado, espelhando nesta frase dita por ele: “Adorar é ir ao essencial: é o caminho para se desintoxicar de tantas coisas inúteis, de vícios que anestesiam o coração e entorpecem a mente”. Que assim seja! Anunciar a Boa Nova esperançando teimosamente na resistência às forças do ante Reino.