Segundo Domingo da Páscoa. Domingo da Misericórdia. Se bem que a misericórdia deve ser o cardápio para todos os dias, pois Deus é por essência, misericórdia em pessoa. Esta é a face do Deus que Jesus veio nos revelar. Um Deus de amorosidade plena, que nos ensina que o caminho a ser percorrido por aqueles que creem e seguem a Jesus de Nazaré passa, necessariamente, pelo amor misericordioso, nos moldes de Deus. Como diz um dos provérbios judaicos: “Não há verdadeira justiça sem misericórdia”. No processo de humanização que devemos assumir como projeto de vida, o amor misericordioso tem que fazer parte da essência do nosso ser cristão.
Um domingo diferente aqui pelas bandas do Araguaia. Depois do calor absurdo que predominou no dia de ontem, a madrugada foi “invadida” por uma forte chuva, com direito a raios e trovoadas. Consequentemente, o domingo amanheceu com um aprazível frescor. Nada como um dia após o outro e uma noite entre eles, para nos provar que a natureza tem a sua lógica própria, apesar das nossas constantes agressões. Daí a necessidade de ficarmos atentos a nossa conversão à Ecologia Integral, no cuidado da nossa Cada Comum, se é que desejamos um futuro melhor para nós e para as gerações futuras, como nos chamou a atenção o Papa Francisco na Laudato Si: “Todos podemos colaborar, como instrumentos de Deus, no cuidado da criação, cada um a partir da sua cultura, experiência, iniciativas e capacidades”. (LS 14).
Cada um fazendo a sua parte contribuindo para o todo. Somos partícipes do processo de construção de uma vida melhor para todos, como era a preocupação de um dos intelectuais que marcou positivamente o nosso pensamento. No dia de hoje, falecia na Itália o filósofo e escritor marxista Antonio Gramsci (1937-1891). Ele foi o idealizador do conceito “intelectual orgânico”, para designar aqueles que atuam para criar, junto à sociedade, a consciência correspondente aos interesses das classes que representam. Gramsci marcou-me profundamente durante o curso de filosofia, sobretudo depois que li “Os Líderes E As Massas”, uma coletânea de textos escritos entre os anos de 1921 a 1926, que revelam as lutas, desafios e reflexões durante um período tumultuado na história do movimento operário. Gramsci dizia que “o desafio da modernidade é viver sem ilusões, sem se tornar desiludido”.
Desiludidos como estavam os discípulos de Jesus, logo após a sua morte, como podemos ver no texto do Evangelho de João, que a liturgia deste Segundo Domingo da Páscoa, nos oportuniza refletir com os pés no chão. “Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam, Jesus entrou e pondo-se no meio deles, disse: A paz esteja convosco”. (Jo 20,19) O Clima era o pior possível para aqueles que haviam depositado toda a sua esperança em Jesus de Nazaré, mas que fora brutalmente assassinado pelo Império Romano. Como ter esperança, depois de terem testemunhado a morte vencendo a vida? Como acreditar Naquele que era o profeta da esperança, mas que havia sido pendurado numa cruz? O medo impede o anúncio e o testemunho.
Estas dúvidas estavam presentes na cabeça e no coração dos discípulos. Tanto que, ao se encontrarem com eles, agora como o Ressuscitado, as primeiras palavras de Jesus, são sobre a paz. Jesus sabia que o clima não era bom, pois eles não haviam acreditado em suas palavras sobre o seu ressurgimento. Eles não acreditaram na força do amor. Somente quem se deixa contagiar pela força transformadora do amor é capaz de acreditar que a vida vence a morte sempre. Foi assim com Jesus e é assim também para todos e todas que acreditam na força revolucionária do amor em nossas vidas. Por acreditar no poder do amor, um dos maiores cientistas da humanidade afirmou: “um ato de amor é maior que o universo físico inteiro”. (Albert Einstein) Amor de Deus. Amor de Jesus. Foi também movido pela força irresistível do amor, que Paulo escreveu assim em uma de suas cartas: “Tudo posso naquele que me fortalece”. (Fil 4,13) Quem acredita no amor, acredita em si mesmo e no outro.
Entre os discípulos de Jesus, haviam aqueles que não acreditavam, mesmo diante do testemunho daqueles que estiveram com o Senhor Ressuscitado. É o caso de Tomé, no relato joanino de hoje. Só acreditaria se visse e colocasse o seu dedo nas feridas do Crucificado. Não havia superado o primeiro plano. Tomé, como muitos de nós, não acreditam que Deus é que tem a última palavra e esta é a vida e não a morte, de quem quer que seja, muito menos de seu Filho Amado. “Acreditaste, porque me viste? Bem-aventurados os que creram sem terem visto!” (Jo 20,29) O recado foi dirigido a Tome, mas pode ser estendido a cada um de nós. Não vimos e nem convivemos com o Jesus histórico, e nem estivemos presentes no calvário, mas, desde já, nos tornamos bem aventurados, por meio destas palavras de Jesus. Somente uma fé embasada no amor é capaz de fazer de nós testemunhas do Ressuscitado. É através do nosso testemunho fiel, que as pessoas crerão em Jesus vivo e ressuscitado. Contra o pessimismo do pensamento racional, entremos com a força transformadora do amor incondicional: Jesus está vivo no meio de nós!
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