Terça feira da décima terceira semana do tempo comum.
O lecionário da Igreja Católica reservou para o dia de hoje a Festa de Santo Irineu. Este cristão do final do século II, foi um grande bispo da história da Igreja, tornando-se também um dos grandes doutores. Seu sangue foi derramado em martírio no dia 28 de junho de 202, razão pela qual celebramos hoje sua entrega confiante. Um seguidor fiel de Jesus de Nazaré, que expressou a sua fé no Ressuscitado desta forma: “Por causa do seu amor infinito, Cristo tornou-se naquilo que nós somos, para fazer plenamente de nós aquilo que ele é. O Divino de Deus se fazendo humano, oportunizando-nos experimentar a Divindade de Deus em nós.
Uma semana promissora para a nossa Igreja aqui da Amazônia Legal. No dia de ontem, aconteceu no Vaticano, a audiência concedida pelo Papa Francisco aos bispos dos Regionais Norte 2 (Pará e Amapá) e Norte 3 (Tocantins). Ocasião importante, pois o Papa está completando nestes dias 30 anos de ordenação episcopal. A “Visita Ad Limina Apostolorum” que traduzido quer dizer “Visita ao limiar dos Apóstolos” é uma prática dos bispos, que vão em peregrinação ao túmulo dos Apóstolos São Pedro e São Paulo e se encontrar com o sucessor de Pedro, o Papa.
Uma visita pra lá de importante, num dos momentos em que a Amazônia está sendo terrivelmente atacada e os povos da floresta seriamente ameaçados. Razão pela qual levou o presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM-Brasil), Dom Evaristo Pascoal Spengler a firmar ao Papa Francisco: “os ataques cada vez mais sistemáticos, de destruição que vem sofrendo a Amazônia, os seus povos, territórios e lideranças. O território amazônico sangra e morre diante dos nossos olhos: invasões a territórios indígenas, quilombolas e ribeirinhas por mineradoras, fazendeiros, criadores de gado, pelos madeireiros e pelo agronegócio.” Um recado bem dado. Só não entende mesmo quem não quer entender. Genocídio misturado ao etnocídio e ao ecocídio.
Apesar de tanta clareza na fala do presidente da REPAM-Brasil, uma parcela significativa de nossa Igreja vive em outra estratosfera. Parte considerável de padres e bispos seguem ainda apoiando o genocídio impetrado contra a população brasileira, fazendo-nos acreditar que não se trata mais de uma mera opção política, mas desvio sério de caráter. As orientações do Papa Francisco no sentido de conduzir a Igreja para um encontro real com os que mais sofrem, a exemplo das primeiras comunidades cristãs, não tem repercussão alguma para uma parcela desta Igreja, que segue na sua ilha da fantasia clerical. Se não escutam o sucessor de Pedro, muito menos leem aquilo que ele escreve.
Vivemos uma crise institucionalizada. Crise na política. Crise moral, ética e social. Crise de valores. Crise também na Igreja que, apesar do Concilio Vaticano II (1962-1965), não consegue acompanhar os sinais dos tempos e dar respostas aos desafios da história. Uma tempestade machista patriarcal, clericalista toma conta do ser Igreja hoje do século XXI. Não somente as diretrizes deste importante documento da Igreja foram abandonadas, bem como as séries de Conferências Episcopais latino-americanas deixaram de ser objeto de leitura, estudos e conhecimentos de boa parte da nova geração de presbíteros. Diante desta tempestade ficamos nos perguntando: Que Igreja somos, e que tipo sociedade queremos formar a partir de nossa ação pastoral? Quais os desafios estão no horizonte de nossa experiência concreta de fé? Que respostas em meio a tempestade, somos instigados a dar, visando a construção do Reino? Quais tempestades atormentam mais o nosso ser hoje?
Neste sentido, a liturgia desta terça feira pode nos ajudar a responder a estas perguntas. No texto que nos é apresentado no dia de hoje, os seguidores de Jesus estão passando por uma ligeira tempestade, enquanto o Mestre deles dorme tranquilamente. Apesar do Salvador da Vida estando ali presente com eles, mesmo assim não conseguiram ter a confiança necessária para acreditar na proteção divina do Deus que é tudo em todos na pessoa de Jesus. A entrega tem que ser confiante para que a missão seja realizada com eficácia. A tempestade esta no ideário da missão. É parte constitutiva dela. O próprio Jesus assim o disse: “Eu garanto a vocês: quem tiver deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos, campos, por causa de mim e da Boa Notícia, vai receber cem vezes mais. Agora, durante esta vida, vai receber casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e campos, junto com perseguições”. (Mc 10, 29-30) É na tempestade em meio a crise, que uma fé confiante e equilibrada consegue perceber a presença de Jesus no meio das nossas lutas. Assim sendo, lutar não é em vão. E quem não luta pelos seus direitos não é merecedor deles. Deus é o Senhor da história e nós somos os seus artífices.
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