Terça feira da Sexta Semana do Tempo Comum. Já de volta ao meu cantinho, aqui no Araguaia, depois do cansaço que é o bate e volta em Cuiabá, objetivando participar ativamente da reunião do Sindicato dos Profissionais da Educação (Sintep/MT). O corpo sente as 25 horas sacolejando dentro do ônibus, ainda mais um corpo beirando o septuagenário. Todavia, a sensação do dever cumprido como sindicalista, alivia qualquer cansaço, ainda mais sabendo que se está lutando pela valorização desta categoria tão menosprezada pela classe politica deste país, mesmo compreendendo que todas as categorias profissionais, necessariamente passam pelas “mãos” dos educadores, espalhados pelas todas as escolas deste país afora. Como bem sintetizou nosso querido psicanalista, educador, teólogo Rubem Alves (1933-2014): “Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas. Agradeço aos meus professores por sempre me fizerem voar!”
Por falar nos teólogos, a data de hoje marca a morte de um grande Doutor em Teologia: Martinho Lutero (1483-1546) Ao entrar na Ordem Agostiniana em Frankfurt, no dia 17 de julho de 1505, Lutero dedicou-se fielmente às orações e a meditação. Como um monge agostiniano e professor de teologia alemão, se tornou uma das figuras centrais da Reforma Protestante, dando início a um movimento de reforma do Cristianismo no século XVI. Ele não concordava com algumas práticas da Igreja na época, e procurou realizar uma reforma no interior do catolicismo, questionando algumas ações por meio das 95 teses, afixadas na porta da Igreja de Wittenberg, criticando as práticas avarentas e pagãs dentro da Igreja Católica. Esta ação de Lutero desencadeou um grande movimento, que ficou conhecido como Reforma Protestante, resultando em um cisma no interior da cristandade na Europa. Surgiu assim o Protestantismo, uma ala do cristianismo com interpretações diversas da que é praticada pela Igreja Católica. Martinho Lutero começou sua vida como católico e morreu como herege.
“Deve-se doar com a alma livre, simples, apenas por amor, espontaneamente!” Com este pensamento de Martinho Lutero, reiniciei o meu trabalho nesta manhã, rezando e refletindo com as palavras de Jesus, narradas pelo evangelista Marcos, onde Ele provoca os seus discípulos a terem atitudes e práticas de partilha. Ao anunciar o Reino de Deus, Jesus faz uso insistente e permanentemente da “Pedagogia da Partilha”. Uma realidade que o discipulado demorou enormemente para entender como prática religiosa, uma vez que era também influenciados pela sociedade da época, onde a religião ministrada no Templo de Jerusalém, visava antes de tudo o bem estar dos dirigentes religiosos, enquanto o povo se lascava. A palavra de Jesus está em sintonia com as suas ações, uma vez que, por diversas vezes, Ele promoveu a partilha, saciando os anseios da multidão faminta.
Na verdade, a prática pedagógica de Jesus, quanto ao repartir o pão com o faminto, segue na mesma lógica da profecia de Isaias que, a seu tempo, assim dizia: “O jejum que eu quero é este: acabar com as prisões injustas, desfazer as correntes do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e despedaçar qualquer jugo; repartir a comida com quem passa fome, hospedar em sua casa os pobres sem abrigo, vestir aquele que se encontra nu, e não se fechar à sua própria gente”. (Is 58,6-7) Somente através de uma vontade decidida, o pensamento e as atitudes do coração voltadas para às necessidades do outro, sobretudo quanto à sua subsistência alimentar, é que estaremos em sintonia com a pedagogia da partilha de Jesus. Quem não sabe o que é partilhar não sabe quem foi Jesus. Como diria o arcebispo Anglicano sul africano Desmond Tutu (1931-2021): “Quando se recusa a partilhar alguma coisa corre-se o risco de perder tudo”, inclusive o sonho de Deus, diria eu.
Vivemos em meio a uma sociedade do consumo exacerbado e da necessidade constante das pessoas “Ter” sempre mais, e não “Ser”, dando o melhor de si nas relações de irmandade, contrariando o desejo de Jesus ao anunciar o Reino da justiça, paz e fraternidade. A “pedagogia do descartável” tomou conta de nós, quando agimos assim até nas nossas relações interpessoais. O outro serve para mim até quando forme-me útil. Passando disso, o descarto sem nenhuma cerimonia. Estes são os frutos de uma sociedade da ganância e da acumulação, que prima pelo “Ter” e não pelo “Ser”: Sou o que tenho e não quem realmente sou!
“E vós ainda não compreendeis?” (Mc 8,21) Também os discípulos de Jesus tiveram enorme dificuldade de entender a proposta de partilha ensejada por Ele. Os discípulos se preocupam por não terem acumulado pão. Jesus chama a atenção deles para não ficarem presos a um sistema que visa a acumular coisas para ter segurança (fermento dos fariseus e de Herodes). É preciso confiar na partilha: tudo o que se reparte, torna-se até mais do que suficiente. Esta é também as nossas experiências feitas nos encontros das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs): o que cada um traz, é colocado na mesa da partilha, onde todos comem e ficam saciados. Esta deve ser também a experiência que fazemos na Mesa Eucarística: todos saem saciados. Participar da Mesa Eucarística, comprometemo-nos a ser pão partilhado, levando para a vida a experiência “Cristica” de Jesus. Como educador, finalizei a minha reflexão de hoje com o pensamento de nossa poetisa maior: “Quem compartilha o que sabe, muda a história de quem aprende”. (Cora Coralina)
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