Segunda feira da Décima Primeira Semana do Tempo Comum. Estamos entrando nas duas últimas semanas, que ainda temos pela frente, do mês de junho. Como é costume aqui pelas bandas do Araguaia, as noites são bem mais frescas, muito embora durante o dia o “senhor sol”, não se faz de rogado, e reina absoluto. Muitas praias já podem ser visitadas ao longo do Araguaia, já que nesta época do ano, ele perde sensivelmente parte de suas águas. Para quem aprecia a natureza, esta é a ocasião apropriada para um bom passeio de barco rio abaixo ou acima, contemplando as mais belas praias de água doce que conheço. A exuberância da natureza por aqui ainda é bela.

Rezei preguiçosamente nesta manhã, na companhia dos vários visitantes que “invadem” o meu quintal todas as manhãs. Não fazem cerimonia e degustam, a vontade, dos frutos que produzo também para eles. Já que as jacas estão em processo de maturação, desta vez são as jabuticabas e o açaí que servem ao paladar dos emplumados forasteiros. Rezei salmodiando com a citação que serve de antífona do Evangelho de hoje: “Vossa palavra é uma luz para os meus passos, e uma lâmpada luzente em meu caminho”. (Sl 118 (119),105) A Palavra é a revelação de Deus, que nos levam a descobrir o sentido da vida e a discernir o caminho a seguir na história, em meio às tantas e diversas situações que experimentamos.

Nestes dias, a liturgia católica está dando uma pausa em Marcos, que é o evangelista da vez, nos trazendo a reflexão de Mateus. Este evangelista é bastante categórico nos apresentando Jesus como o Messias que realiza todas as promessas feitas no Antigo Testamento. Só que esta realização ultrapassa todas as expectativas puramente terrenas e materiais dos contemporâneos de Jesus, que esperavam por um rei nacionalista para libertá-los da dominação romana. Frustrados em suas expectativas, eles o rejeitam e o entregam à morte. Por isso, a comunidade reunida em torno de Jesus torna-se agora a portadora da Boa Notícia à todas as pessoas, a fim de que elas pertençam ao Reino de Deus que Mateus, especificamente chama de Reino do Céu.

Como nos dias anteriores, estamos hoje dando continuidade ao “Sermão da Montanha”. O tema central do ensinamento de Jesus hoje é a violência que caracterizava a Lei no tempo antigo: “Ouvistes o que foi dito: ‘Olho por olho e dente por dente!’” (Mt 5,38) Esta é uma lei famosa dentro do cenário do Antigo Testamento. “Lei de talião” que consiste na compensação ou reciprocidade do crime cometido por uma pena equivalente, por exemplo, punir um assassinato matando o assassino. Pela lei de talião o criminoso deve ser punido de forma equivalente à falta que ele praticou. A palavra talião advém do latim “talio” que significa “retribuição”. É interpretada pela fórmula “olho por olho, dente por dente”. Foi atribuída, originalmente, ao código babilônico de Hamurabi (1770-1750 a.C.) e que alguns livros do Pentateuco transcreveram: “Não tenha piedade: vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé”. (Dt 19,21)

Jesus subverte esta ordem cruel das coisas, marcadas pelo desamor. Sua lógica é a do amor incondicional e gratuito em todas as circunstâncias de nossas relações. A lógica do amor é o caminho inverso do ódio, da vingança, da maldade como principio fundante. A radicalidade do amor de Jesus vai ao extremo ao propor: “Amai vossos inimigos, bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam, e orai pelos que vos maltratam e vos perseguem” (Mt 5,43–44). Ao assim propor, Jesus universaliza o preceito do amor ao próximo, espelhando no amor que Deus tem para com todos os seus, não fazendo distinção de pessoas: “Porque ele faz raiar o seu sol sobre maus e bons e derrama a chuva sobre justos e injustos”. (Mt 5,45) Assim sendo, Jesus suprime a pretensa preferência, e quase exclusividade do amor aos amigos e àqueles que estão dentro do círculo das nossas amizades.

Difícil? Muito! Impossível? Não! Num mundo marcado pelo ódio e pela violência cada vez maiores, fica difícil colocar em prática esta proposta de Jesus. Somente um coração cheio de amorosidade, misericórdia e compaixão, é capaz de amar ao extremo, como nos pede Jesus. Nosso desafio maior é superar a vingança ou até mesmo a “justa” punição. É por isso que Jesus propõe uma atitude nova, a fim de eliminar pela raiz o círculo infernal da violência. Ou seja, a resistência ao inimigo não deve ser feita com as mesmas armas usadas por ele, mas através de um comportamento e atitude que o desarme. O grande líder indiano Mahatma Gandhi (1869-1948) entendeu e pôs em prática esta assertiva de Jesus ao escrever: “A não violência é a mais poderosa que todos os armamentos no mundo. É a mais forte que a mais forte arma destruidora inventada pela ingenuidade do Homem”.