Nono Domingo do Tempo Comum. Junho chegou trazendo-nos noites mais frias e o vento soprando a poeira por aqui. O sexto mês do ano vai dando as suas coordenadas. No sul do país, as famílias devagar vão retornando ao que restou de suas casas e suas histórias de vida. Um amontoado de entulhos as aguardando. Muito triste ver as cenas de quem tudo perdeu. Muitos sonhos e projetos naufragados nas águas. Em meio ao clima gélido, os corações buscando esperança para continuar lutando para reconstruir. É preciso muita força para não deixar sucumbir ao desespero. Sonhar, acreditar, fazer!
Depois de dois domingos festivos (Pentecostes e Trindade Santa), damos um tempo nas festividades e retornamos ao ciclo litúrgico do Tempo Comum. Se no Ano A, refletimos com o Evangelho de Mateus, no Ano C com Lucas, no Ano B é a vez de Marcos. Esta divisão foi uma forma pedagógica que a Igreja encontrou, para que nós pudéssemos acompanhar mais assiduamente as leituras, tendo uma visão geral e conjunta sobre a Palavra de Deus. Assim, os tempos litúrgicos alimentam a nossa fé, renovando a esperança, nos fazendo entender que o tempo cronológico é passageiro e que devemos passar do “cronos” para o “Kairós”, ou seja, o tempo da graça de Deus.
A grande temática deste domingo é a observância rigorosa da Lei que os fariseus dizem a Jesus que nem os seus discípulos e nem Ele próprio, estavam cumprindo, conforme manda o preceito religioso da época. Segundo estes líderes religiosos, Jesus e seus discípulos estavam deixando de cumprir a Lei do sábado, que era considerada pela Lei judaica como o Dia do Senhor. Como os fariseus eram exímios cumpridores da Lei, eles não aceitavam que Jesus, sendo um líder, permitisse que os seus não cumprissem aquilo que estava prescrito na Lei. Lembrando que havia um conjunto de 613 mandamentos que formavam o corpo legal judaico que, de acordo com o judaísmo, constam na Torá, os cinco livros de Moisés: Gênesis. Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.
A liturgia do 9º Domingo do Tempo Comum nos convida a refletir sobre a celebração do Dia do Senhor: sábado para os judeus, domingo para os cristãos, fazendo memória da paixão, morte e ressurreição de Jesus, como ação criadora e redentora de Deus para com o seu Povo. Todavia, não se pode fazer uma interpretação legalista rigorista dos preceitos da Lei. Se assim o fazemos, a Lei deixa de cumprir a sua principal missão que é a de estar a serviço da pessoa humana. A pessoa humana está acima de qualquer preceito. É por isso que Jesus fala claramente: “O sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado”. (Mc 2,27) Ou seja, devemos nos posicionar a favor dos necessitados, tendo em vista que o Dia do Senhor foi feito para o homem, não para fazer do homem um escravo.
A mensagem de Jesus é libertadora! Viver o preceito do Dia do Senhor para Ele é abrir o coração para as necessidades dos marginalizados. Por isso, a novidade trazida por Jesus é bem diferente do que propõe o judaísmo rabínico, mostrando a eles que o amor de Deus pelos que estavam marginalizados (os publicamos e pecadores), é muito maior e mais importante que a aplicação rigorosa da Lei de Moisés, e que a experiência de fé deve nos levar a estabelecer um compromisso com o bem estar do outro nosso irmão. Jesus subverte a ordem das coisas e mostra que o centro da obra de Deus é a pessoa humana. Assim, não se trata de estreitar ou alargar a lei do sábado, mas de dar sentido totalmente novo a todas as estruturas e leis que regem as relações entre as pessoas. Na compreensão de Jesus, só é bom aquilo que faz a pessoa crescer e ter mais vida. Toda lei que oprime a pessoa é lei contra a própria vontade de Deus, e deve ser abolida.
O Evangelho de hoje nos ajuda a entender que precisamos revisar muito da nossa prática e concepção de fé. Os fariseus eram extremamente rigorosos no seu modo de viver a fé. Alguns de nós ainda continuamos nos dias hoje, tendo as mesmas atitudes dos fariseus do tempo de Jesus: cumprem por cumprir os preceitos, sem levar em consideração que a pessoa humana está acima de qualquer preceito, normas ou lei. No que diz respeito à Eucaristia, por exemplo, há uma compreensão desta como um mero preceito religioso, esquecendo-se que ela é a mesa da acolhida e da partilha do Pão que consubstancia a presença amorosa de Deus em Jesus como o Pão da vida. Bem disse o Papa Francisco sobre ela: “A Eucaristia não é um prêmio para os perfeitos, mas um remédio generoso e um alimento para os fracos”. Portanto, não se prive de participar, comungando do pão da vida, mesmo que o padre, equivocadamente, se ache no direito de decidir quem deve ou não dela fazer parte. No “Dia do Senhor”, saiba que somos especiais para Deus e que Ele muito nos ama! Todas as leis por Ele criadas foram para nos acolher com amorosidade de Pai e Mãe que só Ele sabe ser.
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