Segunda feira da 2ª segunda semana do Advento.
Apesar do clima da pandemia, aqui e ali começam a aparecer os sinais natalinos. Presépios, guirlandas e os outros adereços mais. Não estou me referindo às “Black Friday” da vida, típicas destes momentos.
Os capitalistas de plantão aproveitam do ensejo para vender os seus produtos. Vender, vender e vender! Tudo o que não possuem é espírito natalino. Isto pouco importa para eles. São movidos pela mentalidade consumista. Que se dane o Natal, conquanto as pessoas criem necessidades desnecessárias.
Mais um final de semana aconteceu em nossa história. Os dilemas da humanidade continuam à luz do dia. Paradoxalmente, a fome é uma realidade que bate a nossa porta. Se não estamos passando por ela, outras famílias ao nosso redor estão. Acompanhei, estupefato a reportagem de uma das emissoras de televisão que trouxe no dia de ontem, o drama da fome. Famílias de desempregados que passaram a conviver com a realidade de não ter o que comer. Pais e mães de família que estão vivendo de donativos e deixando de comer para dar de comer aos seus. A dor da fome, experimentada no próprio estômago. Que triste!
A dor da exclusão. A dor que dói lá dói também do lado de cá. Infeliz da sociedade que não consegue sentir em si esta dor alheia. Uma sociedade indiferente, incapaz de sentir compaixão pela dor do outro. Pelo menos é isto que estamos vendo por parte de alguns de nossos governantes, que estão adotando a infame atitude: “Não deem esmolas. Em assim fazendo, estarão contribuindo para o aumento de pessoas que vão querer permanecer nas ruas, por ser mais fácil de se viver”. Governantes que, alem de não adotarem políticas públicas inclusivas à estes necessitados, ainda comparam as atitudes solidárias de algumas pessoas com a “política de esmolas” de suas assistências sociais.
Já ultrapassamos a casa das 20 milhões de pessoas que estão passando fome hoje no Brasil. Esta realidade não diz respeito à maioria de nossos políticos, muito menos àqueles encastelados nas cortes, que deveriam cuidar de fazer a justiça acontecer. Uma justiça cega, surda e feita para contemplar alguns poucos que podem pagar caro por ela. Seus volumosos salários continuam sendo pagos rigorosamente em dia. Este é um dos resultados do país desigual, que aprendemos a conviver no dia a dia, com absoluta normalidade.
O Papa Francisco em sua Exortação Apostólica Evangelli Gaudium, ou Alegria do Evangelho, publicada no ano de 2013. nos faz o seguinte alerta: “A dignidade da pessoa humana e o bem comum estão por cima da tranquilidade de alguns que não querem renunciar aos seus privilégios. Quando estes valores são afetados, é necessária uma voz profética. (Exortação Apostólica Evangelii Gaudium nº 218). Uma chamada de atenção para todos nós que fazemos parte da caminhada de Igreja. Todavia, acompanhando as celebrações que ocorreram neste final de semana nas redes televisivas, não vi e nem ouvi nenhum dos celebrantes se referirem em suas reflexões homiléticas, a esta realidade de fome, desemprego e exclusão. Famílias inteiras jogadas nas ruas. Talvez porque os celebrantes estejam equidistantes desta realidade a ponto de não serem afetados por esta tragédia da vida real.
“A cabeça pensa a partir de onde os pés estão pisando”, dizia-nos acertadamente o teólogo Leonardo Boff. Ou seja, se os nossos pés não estão enlameados pela realidade daqueles que passam fome, dificilmente a nossa mente abstrairá esta realidade. Eu diria que, não somente a mente aproximará desta realidade, assim como também o coração não pulsará no compasso deste sofrimento da dor do outro. Sentir no coração a dor do outro é aquilo que Jesus nos indicou através do sentimento de misericórdia. Uma palavra latina que no seu sentido original significa ter o coração (cors) voltado para os pobres (miseri), estando em comunhão com eles, sentindo em si mesmo a dor do outro.
Como fez Jesus de Nazaré no texto que nos é apresentado pela liturgia de hoje. Trouxeram a Ele um pobre acamado, para que o curasse de sua paralisia. Jesus não somente devolve a ele a mobilidade física, mas também o reintegra à sociedade, visto para a concepção da época, a doença era causada pelo pecado que a pessoa havia cometido. Além de devolver a dignidade humana àquele pobre homem, Jesus confronta as lideranças político-religiosas que nada faziam por aquelas pessoas e ainda reforçavam nelas o caráter de seres amaldiçoados por Deus. Como Jesus, precisamos aguçar em nós o poder profético das palavras, muito embora, como mesmo dizia nosso bispo Pedro: “Profeta é aquele que grita com os olhos”. Que os nossos olhos gritem aquilo que sentimos em nosso coração diante da dor da exclusão.
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